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Guida | Crítica

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Guida, Rosana e o sonho

Guida é um curta-metragem de 2014 dirigido por Rosana Urbes e feito totalmente no papel. O filme é uma homenagem à velhice, é sobre se sentir bem com você mesmo, demonstrando que não existe limite de idade para mudar e buscar a felicidade.

Rosana é ilustradora de livros e animadora. Trabalhou em projetos internacionais durante anos, tendo sido, por exemplo, animadora de “Mulan”, “Lilo & Stitch” e “A nova onda do imperador”. Ela conta que “animação é uma arte muito complexa. O animador tem que ter noção de atuação já que o personagem vai ser um ator, tem que ter um design forte porque vai ter que desenhar esse personagem em um plano bidimensional se movimentando no espaço, tem que conhecer um pouco de física porque tem que entender de aceleração e desaceleração. É uma arte que envolve muitas artes”.

Guida começou de um risco despreocupado em um canto do caderno. “Quando comecei a trabalhar com animação, rabisquei poses de uma senhorinha dançante”, conta Rosana em entrevista ao Anima Mundi, “ela era bem diferente de agora: gordinha e tocava pandeiro. Lembro de olhar pra ela, decidir o nome e escrever na folha dos rabiscos: Dona Guida. No início a história era bem diferente. Guida tinha um interesse romântico, Seu Roberval, e os dois terminavam juntos, num Baile da Saudade. Eu gosto muito dessa versão e sofri para desistir dela, mas esse filme era da Guida. E ela, pouco a pouco, me mostrou isso”.

Rosana Urbes
Rosana Urbes

O curta-metragem retrata, com traços bonitos, o dia a dia de uma mulher idosa. Nos apresenta sua casa e sua rotina e assistimos a sua inspeção diária no espelho, enquanto ela percebe seu corpo e demonstra descontentamento com as marcas da idade. A personagem trabalha há 30 anos no arquivo de um fórum, um serviço monótono, sem novidades ou emoções.

Certo dia, Guida vê no jornal um anúncio buscando uma voluntária para trabalhar como modelo-vivo diante de uma turma de pintores. Animada e finalmente motivada, ela responde ao anúncio. Inicialmente tímida, ela vai se libertando e passa a se sentir confortável com seu corpo e com seus movimentos.

Através dos olhos de cada um dos artistas, ela se torna várias. Se torna Frida, se torna boxeadora, violinista, bailarina. Assume diversos estilos. Através dos olhos deles, Guida é eternizada e alcança vidas e espaços muito além do fórum. Ela deixa de usar o espelho do banheiro, no qual se via de forma pessimista, e passa a ver o seu reflexo através dos pintores, uma imagem que ganha mais cores e mais liberdade.

Guida é um curta-metragem sensível que fala sobre nossas motivações e sobre o que nos faz sentir vivos. Explica que nunca é tarde para iniciar novas atividades e para buscar algo que nos faça sentir bem, estimulando que todos se permitam fazer algo com paixão e liberdade, independentemente da idade ou de qualquer outra barreira que a sociedade possa tentar impor. Para a diretora, “Guida é uma sonhadora fora de lugar. É muito difícil viver uma vida de sonho, criativa, porque tem um massacre no dia a dia das coisas práticas”. Por esse motivo, Guida é uma espécie de auto-retrato da diretora.

O filme foi premiado no Festival de Annecy, em 2015, e venceu em quatro categorias no Anima Mundi de 2014. Rosana foi, inclusive, a primeira mulher a ganhar o prêmio de Melhor Curta-Metragem no Anima Mundi. “Por muitos anos trabalhei em estúdios onde eu era a única mulher. Isso começou a mudar, aqui no Brasil, muito recentemente” explicou ela. “Nas oficinas de animação que desenvolvemos no estúdio tem muitas meninas. A mudança no cenário envolvendo maior participação de mulheres está acontecendo, para o bem de todos nós. O meu sonho era ver a animação brasileira encontrar seu caminho, a produção crescer, o Anima Mundi seguir forte, e eu ser parte disso. Quando ouvi a Aida Queiroz dizer ‘Guida’ no palco do Anima Mundi (durante a premiação), entendi, naquele momento, que tinha acontecido. E foi melhor que o sonho”.


Filme na íntegra:

Rosana Urbes fala sobre a sua profissão:

Entrevista da diretora ao Anima Mundi.

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

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