Duna: Parte Dois continua a história de seu predecessor de 2021. Assim como a primeira parte, a segunda tem direção de Denis Villeneuve. Já o roteiro é dele com Jon Spaihts. Duna: Parte Dois finaliza a adaptação do romance de Frank Herbert, de 1965, intitulado Duna. O filme teve 5 indicações no Oscar 2025: Filme, Fotografia, Design de Produção, Som e Efeitos Visuais.
O filme situa-se no gênero da ficção científica e continua a história de Paul Atreides (Timothée Chalamet). No primeiro Duna, conhecemos o nosso protagonista, Paul, filho de um duque. Sua família foi comandada pelo imperador (Christopher Walken) a governar o planeta de Arrakis, economicamente vital por sua produção de especiaria, a substância utilizada para realizar viagens interestelares. No entanto, rivalidades entre os Atreides e os Harkonnen (os antigos senhores feudais de Arrakis) culminam em um massacre cujos únicos sobreviventes são Paul e sua mãe Jessica (Rebecca Ferguson). Exilados no perigoso deserto de Arrakis, acabam sendo acolhidos, mesmo que a contragosto de muitos, pelos Fremen, a população nativa daquele planeta.
Desde o primeiro filme, Paul tem sonhos misteriosos com Arrakis e o poder de comandar os outros com a sua voz. No decorrer de Duna, descobrimos que suas habilidades vêm de sua mãe que faz parte de uma importante ordem religiosa composta apenas de mulheres, as Bene Gesserit. Sua mãe, na tentativa de gestar o Kwisatz Haderach, um homem com o poder de atravessar o espaço-tempo – o messias, o predestinado, desobedeceu às instruções da ordem que apenas permitia que ela tivesse filhas.
Paul seria esse “predestinado” e sua jornada em Duna: Parte Dois tem como base os seus poderes. Em Arrakis, o messias é conhecido como Lisan Al Gaib e, desde o filme anterior, muitos já veem Paul como essa presença (devido, em grande parte, a missões missionárias das Bene Gesserit). Paul, inicialmente, recusa o título, no entanto, logo percebe que assumindo tal papel, ele possuiria uma importante ferramenta para saciar o seu desejo de vingança pela morte do pai e dos amigos.
Por outro lado, ao ser aceito como um guerreiro Fremen e se envolver romanticamente com uma, Chani (Zendaya), Paul vê-se dividido. Deseja vingar-se, mas também fazer parte de algo maior (a cultura Fremen) e ser visto como um igual (nem como estrangeiro, nem como profeta). Além disso, passa a ter visões mostrando futuros terríveis, enquanto sua mãe está comprometida a sua própria visão de futuro e manipulará tudo e todos para alcançá-la.
Duna: Parte Dois provoca ao questionar dinâmicas de poder que existem também em nosso mundo real. Paul encarna a figura do “salvador branco”, que é visto por muitos, desesperados por dias melhores, como a única solução. Outros, no entanto, o veem como uma ameaça. Os Fremen devem ser liberados de sua opressão por um dos seus e não por um profeta estrangeiro. Ou melhor, o povo deve ser o responsável pela sua própria libertação. A personagem que encarna essa visão é Chani, par romântico de Paul. Analiso o personagem mais a fundo nas próximas seções deste texto.
Com esse filme, encerra-se a adaptação de Villeneuve do romance Duna, no entanto já está em produção uma sequência que adaptará o livro de 1969, O Messias de Duna, também de Frank Herbert. De acordo com o diretor, esse filme encerrará a sua trilogia de Duna. A seguir, vamos analisar Duna: Parte Dois com o nosso Teste Arte Aberta!
Para saber mais sobre o teste, confira o texto introdutório.

Sinopse
De acordo com a percepção do Arte Aberta evitando spoilers
Após a aniquilação da Casa Atreides, Paul e sua mãe Jessica buscam exílio entre a população nativa de Arrakis, os Fremen. Enquanto alguns suspeitam que sejam espiões, outros veem Paul como o profeta Lisan Al Gaib. Paul treina com os guerreiros Fremen e participa de ações de guerrilha na tentativa de combater os Harkonnen, os opressores do povo Fremen e responsáveis pelo massacre dos Atreides. Ao mesmo tempo, Paul passa a ter assustadoras visões do futuro e percebe que logo deverá fazer uma importante e terrível escolha. De um lado, Paul encontra o senso de pertencimento entre os guerreiros Fremen e um relacionamento sincero com Chani, de outro, está o poder de Kwisatz Haderach ou, para os Fremen, Lisan Al Gaib, capaz, quem sabe, de mudar o futuro do universo conhecido.

Ótica de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD
Duna: Parte Dois é, em primeiro lugar, um filme sobre o seu protagonista, Paul, um rapaz branco, aparentemente heterossexual, sem deficiência. Todos os outros personagens e até a própria história do filme orbita em torno dele. Dessa forma, não conhecemos muito dos outros personagens para além do que ele significa em relação a Paul.
Ainda assim, há pontos que merecem ser destacados. Em relação ao próprio enredo, há uma oposição entre o império e suas casas nobres e o povo Fremen. Nesse caso, o império representa o ‘ocidente’, o eurocentrismo, o colonialismo e até a branquitude. Já os Fremen apesar de não serem necessariamente interpretados por atores não brancos, representam o outro, o ‘oriente’, o ‘exótico’, os povos originários e até mesmo o natural (em oposição à artificialidade dos Harkonnen, por exemplo). Os Fremen são oprimidos e vitimizados, mas são valentes. Tem um código de honra forte e são leais. Os Fremen são bem mais crédulos do que os personagens advindos do império. Também são, muitas vezes, violentos. Todas essas características são estereótipos vinculados a povos originários não brancos, o que é questionável. Por outro lado, os Fremen são muito mais carismáticos como cultura do que o restante do império (com exceção dos Atreides que foram eliminados no filme anterior, então não me adentrarei nesse aspecto). Dessa forma, nota-se uma idealização dos povos originários não brancos representados de forma fantasiosa nos nativos de Arrakis.

Outro importante grupo do universo de Duna são as Bene Gesserit, uma importante organização religiosa composta apenas de mulheres. As Bene Gesserit dizem servir o império, mas possuem seus próprios objetivos, dentre eles a criação do Kwisatz Haderach. Essas mulheres possuem poderes aparentemente sobrenaturais que incluem a habilidade de determinar o sexo dos seus bebês, de manipular outras pessoas através da voz, dentre outras. Elas são muitas vezes chamadas de ‘bruxas’ e vistas pelos outros com um misto de medo e respeito. É sem dúvida interessante pensar em uma força religiosa/política totalmente matriarcal. Acho que só isso já causa uma certa desconstrução das nossas expectativas. Por outro lado, também é relevante pensar que o poder político visível (o imperador, o duque, o barão) é masculino. O poder feminino continua a operar pela sombra e é construído a partir de características estereotipicamente femininas como a manipulação, o sexo, o misticismo e a própria feitiçaria.
Já quanto a personagens mulheres de destaque, vale mencionar Chani, Jessica e a Princesa Irulan (Florence Pugh).
Chani também é a personagem não branca de maior destaque na trama. Ela é uma jovem guerreira Fremen e o par romântico de Paul. Chani não acredita que Paul seja o profeta e não acredita que tal profeta sequer exista. Ela representa a crença de que o povo deverá se libertar ao invés de esperar por um salvador vindo de fora. Ao mesmo tempo, ela se apaixona por Paul, mas sua relação com ele é pessoal: o ama como homem e quer acreditar que ele seja um bom homem, um bom líder, mas só isso. Para ela, é importante que Paul permaneça sincero e que não seja seduzido pelo poder. Uma quebra interessante de expectativa é quando Chani se decepciona com Paul e decide que não mais o seguirá. Ela decide seguir seu próprio caminho ao invés de ficar nas sombras de um homem que já não reconhece mais.

Jessica, a mãe de Paul, continua a demonstrar a ambição que a caracterizou no primeiro filme. Após consumir a Água da Vida e se tornar uma Madre Reverenda, posição importante dentre as Bene Gesserit, ela se torna cada vez mais obstinada e até cruel em sua busca por tornar o seu filho o Kwisatz Haderach. Ela e Chani simbolizam os dois possíveis caminhos que Paul poderá seguir.

A Princesa Irulan tem uma participação menor, mas também merece destaque. Ela é a filha do imperador, treinada como Bene Gesserit, caracterizada como uma mulher inteligente, capaz de analisar situações políticas difíceis e propor soluções. No entanto, o império é uma instituição patriarcal, o que torna as suas opções de futuro muito limitadas (quem casar com ela será o próximo imperador). Dessa forma, apesar de ser uma adição interessante aos personagens, Irulan é passiva. Ela simplesmente está lá. Quando necessário, sacrifica a sua liberdade e futuro pelo pai. O seu caminho é bastante previsível.

Já quanto a outros personagens não brancos, nenhum chama atenção como Chani. O filme apresenta uma única personagem de apoio PcD, creditada como Maker Keeper (Alison Halstead), que cria vermes de areia para produzir a Água da Vida. Há também o Barão Harkonnen (Stellan Skarsgård), um dos principais vilões do filme, que parece precisar de uma tecnologia assistiva para se mover, mas isso não fica muito claro. Dessa forma, optamos por não classificá-lo como PcD. Não há personagens explicitamente LGBTQIA+ no filme. nada, como forma subjugando-os às vontades alheias.
Representatividade de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD
Direção e Roteiro*
* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero
A direção do filme é de Denis Villeneuve, um homem branco. O roteiro fica a cargo novamente de Denis Villeneuve e Jon Spaihts, outro homem branco. Não há informações se algum deles é LGBTQIA+ e PcD.
Dessa forma, a ficha técnica principal (direção e roteiro) é composta 0% por pessoas não brancas, 0% por mulheres, 0% PcD e 0% LGBTQIA+.

Elenco principal*
Créditos iniciais/finais
* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero
Conforme os créditos finais do filme, o elenco principal é composto por 16 atores: Timothée Chalamet, Zendaya, Rebecca Ferguson, Josh Brolin, Austin Butler, Florence Pugh, Dave Bautista, Christopher Walken, Léa Seydoux, Stellan Skarsgard, Charlotte Rampling, Javier Bardem, Souheila Yacoub, Roger Yuan, Babs Olusanmokun e Alison Halstead.
Dessa forma, o elenco é composto por 43,8 % de mulheres (Zendaya, Rebecca Ferguson, Florence Pugh, Léa Seydoux, Charlotte Rampling, Souheila Yacoub, Alison Halstead), 31,3 % de não brancos (Zendaya, Dave Bautista, Roger Yuan, Babs Olusanmokun e Alison Halstead), 6,3 % LGBTQIA+ (Christopher Walken) e 6,3 % de PcD (Alison Halstead).

Representação
Mulheres
Presença (Bechdel-Wallace)
As mulheres têm nome?
Se falam por mais de 60 segundos?
Sobre outro assunto que não seja homens?
Reprovado.
A única conversa entre mulheres que não se trata de Paul ou de outros homens é quando Jessica faz perguntas sobre os vermes de areia e a Água da Vida à mulher que os cria. Essa personagem não é nomeada durante o filme (nos créditos finais é chamada de Maker Keeper) e a conversa dura menos de 60 segundos.

Arco Dramático (Mako-Mori)
Tem mulher?
Tem arco dramático próprio?
O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de gênero?
Reprovado.
Chani tem um arco dramático, mas ele é totalmente voltado para o personagem de Paul, ou seja, centra-se em uma relação romântica e afetiva. Chani vive uma dualidade em que ela gosta de Paul, mas acredita que os Fremen devem ser os responsáveis pela sua própria libertação. Ela quer acreditar nas palavras de Paul: que ele não quer poder, não quer ser o Lisan Al Gaib, que quer ser apenas um guerreiro Fremen como ela. Quando Paul demonstra não ser mais o que ela esperava dele, ela se afasta e, por fim, o abandona. A resolução do arco dramático de Chani é interessante e foge do estereótipo de vitimização e passividade geralmente reservado a personagens masculinos. Chani não aceita ficar nas sombras, não aceita ficar com um homem que não reconhece mais. Ela o abandona. Ainda assim, toda a história de Chani é baseada em seu amor por Paul e seu lugar de interesse romântico do protagonista, ou seja, o arco dramático dela é sim apoiado em estereótipos de gênero.

Jessica não tem um drama próprio na narrativa de Duna: Parte Dois. O clímax de sua história ocorre bem no início do filme quando se vê forçada a tomar a Água da Vida e se tornar uma Madre Reverenda. Após isso, ela permanece estática, representando um caminho possível para Paul (em oposição ao caminho de Chani).
Os outros personagens femininos não possuem arcos dramáticos próprios.
Competência (Tauriel)
Houve mulher(es) com atividade profissional definida?
Ela é competente na atividade?
Grau da Competência Caso a mulher seja competente, quão competentes elas são em sua atividade profissional (1 a 5 , sendo 1 – pouco competente e 5 – muito competente)
Houve reconhecimento dessa competência?
Aprovado.
Nota: 5
Chani é uma excelente guerreira. Jessica é uma líder religiosa potente. A Princesa Irulan demonstra conhecimento político e aconselha o pai. As Bene Gesserit são todas poderosas e intimidadoras. Infelizmente, apesar do número de representações de competência e liderança, o filme ainda é totalmente dominado por homens.

Qualidade da representação – mulheres
Como é a representação das personagens mulheres (escala de -1 a 3)
Sendo -1, estereótipos ofensivos;
0, não tem;
1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos;
2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos;
3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos estereótipos
Nota: 2
As personagens femininas são todas secundárias, com uma participação maior de Chani e Jessica, e possuem poucos estereótipos de gênero. São fortes e interessantes, mas existem todas em relação a Paul.

Raça
Arco dramático (Mako Mori)
Tem personagem não branco?
Tem arco dramático próprio?
O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de raça?
Aprovado.
Chani possui um arco dramático próprio. Esse arco dramático é apoiado em estereótipos de gênero (como analisado nas seções anteriores), mas não em estereótipos de raça. Os outros personagens não brancos não possuem arcos dramáticos próprios.

Qualidade da representação – raça
Como é a representação dos personagens não brancos (escala de -1 a 3)
Sendo -1, estereótipos ofensivos;
0, não tem;
1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos;
2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos;
3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos estereótipos
Nota: 2
Os personagens não brancos são todos secundários ou de apoio, com uma participação maior de Chani, e possuem poucos estereótipos de raça. Há uma certa vinculação entre os Fremen (não brancos) e um comportamento crédulo e dependente de um salvador. No entanto, essa característica não é generalizada e a personagem de maior impacto (Chani) não possui essas características.
LGBTQIA+
Arco dramático (Mako Mori)
Tem personagem LGBTQIA+?
Tem arco dramático próprio?
O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de LGBTQIA+?
Reprovado.
Não há personagens LGBTQIA+ na trama.
Qualidade da representação – LGBTQIA+
Como é a representação das personagens LGBTQIA+ (escala de -1 a 3)
Sendo -1, estereótipos ofensivos;
0, não tem;
1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos;
2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos;
3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos estereótipos
Nota: 0
Não há personagens LGBTQIA+ na trama.
PcD
Arco dramático (Mako Mori)
Tem personagem PcD? Tem arco dramático próprio?
O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de PcD?
Reprovado.
Há uma personagem com nanismo no filme. Ela não é nomeada e seu papel é limitado. Há também o Barão Harkonnen, um dos principais vilões do filme, que parece precisar de uma tecnologia assistiva para se mover, mas isso não fica muito claro. Dessa forma, optamos por não classificá-lo como PcD.
Qualidade da representação – PcD
Como é a representação das personagens PcD (escala de -1 a 3)
Sendo -1, estereótipos ofensivos;
0, não tem;
1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos;
2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos;
3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos estereótipos
Nota: 1
A única personagem tem participação muito reduzida.
Resumo do Teste Arte Aberta
Representatividade


Representação



Estrelas Arte Aberta: 1,5
