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Amigas e (não) rivais: parceria entre mulheres ao invés de competição | On my block | #MulheresEmSérie

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On my block é um seriado original da Netflix e conta a história de um grupo de quatro amigos que mora em um bairro perigoso de On my blockRuby, Cesar, Monse e Jamal são amigos desde criança e são muito próximos, o que dificulta alterar a dinâmica do grupo quando chega a adolescência e novas relações vão surgindo.

Cesar, Monse, Jamal e Ruby estão sentados em um sofá e parecem desconfortáveis com alguma coisa. Olham preocupados para a frente.

Além das questões próprias do crescimento e das conexões escolares e familiares comuns a qualquer adolescente, eles vivem no meio do fogo cruzado entre gangues e traficantes. Apesar disso, a série é bem humorada, sendo uma comédia jovial que perpassa temas sérios de forma leve (na maior parte do tempo).

O seriado foi criado por Lauren Iungerich, Eddie Gonzalez e Jeremy Haft e é classificado como coming-of-age, um gênero de narrativa utilizado tanto na Literatura quanto no Audiovisual que trabalha o amadurecimento dos personagens em períodos de transformação e crescimento pessoal. Como parte desse gênero, On my block apresenta quatro jovens em seus dilemas morais, primeiros romances e as dificuldades na transição da adolescência para a vida adulta.

Jamal, Monse, Ruby e Cesar estão de frente para a tela, sérios, com suas mochilhas nas costas. O fundo é todo colorido.

O diferencial da obra é que a maioria dos personagens são latinos, o que proporciona muitos diálogos em espanhol, vivências normalmente não retratadas nas telas, e referências multiculturais, especialmente na casa de Ruby. Assim, a história batida sobre amigos amadurecendo e passando pelas experiências da High School, porém, é retratada sob a perspectiva de um grupo de jovens de famílias latinas, que nasceram nos Estados Unidos e experienciam a mescla de costumes e culturas típicas desses lares, tão comuns no país.

Além do início de uma nova fase no colégio, o grupo ganha mais uma integrante. A família de Ruby recebe Olivia, da mesma idade dos protagonistas, que passa a morar com eles após seus pais serem deportados. A série aborda por meio desse núcleo, mesmo que de forma secundária, a política de imigração e a separação de familiares no governo de intolerância de Trump.

A chegada de Olivia fornece a Monse algo que ela não sabia que queria: a companhia e a amizade de outra garota. Com a ausência da mãe e tendo sido criada pelo pai, Monse sempre se cercou de amizades masculinas. Apesar da proximidade, da lealdade e do amor que sempre teve com o trio de rapazes, Monse cresceu exposta a algumas experiências que os amigos não poderiam compreender em sua totalidade e não tinha ninguém com quem se sentisse confortável para conversar ou dividir as experiências. É o caso, logo no início do seriado, de quando seu corpo muda e seus seios crescem, chamando atenção e olhares dos homens na rua; ou quando são espalhados boatos sobre ela na escola; ou quando é assediada por homens mais velhos, como o irmão de Cesar.

Monse, César, Jamal e Ruby estão encostados em um muro cheio de pichações. Todos olham para a frente, menos César, que olha para Monse.

O seriado utiliza a entrada de uma nova protagonista, jovem, bonita e popular, não para promover rivalidade entre garotas, como muitas obras fazem, mas para somar ao grupo e para fortalecer Monse, construindo uma amizade e criando uma rede de apoio em questões que os meninos não conseguiam suprir.

Mesmo quando se interessam romanticamente pela mesma pessoa (o que geralmente é usado como artifício para justificar o início das hostilidades), a amizade das duas não é posta à prova e, em nenhum momento, elas desejam “ganhar” uma da outra. Diferente de outras histórias, nunca se tratou de uma competição. Apesar de algumas situações gerarem tristeza ou frustração, não é raiva nem ciúme que permeiam a relação entre as duas protagonistas, mas um extremo carinho e preocupação entre as amigas. Os diálogos entre Monse e Olivia partem de empoderamento, de incentivo e do desejo de sucesso para a outra, provando que mulheres (e meninas) fortes, inteligentes, bonitas e poderosas podem ser amigas e podem compartilhar o protagonismo.

Tendo em vista que se trata de uma série cheia de referências e personagens latinos, cabe lembrar da telenovela mexicana Amigas e rivais, exibida no Brasil em 2001 (e que inspirou uma versão brasileira em 2007/2008). A obra era focada nas histórias de quatro moças com realidades diferentes e que tinham seus destinos misturados por motivos diversos. Toda a novela baseava-se em uma relação de amizade que tinha a necessidade constante de competir, o que gerava diversas situações em que uma sabotava a outra e que justificou o título do programa.

Monse faz careta e Olivia fala para uma terceira pessoa "Querida, não".

Infelizmente, o desenvolvimento de amizades prejudiciais e negativas entre protagonistas femininas não se restringe a essa telenovela, sendo comum no audiovisual. Uma série americana que ficou muito famosa mesmo sendo pautada em uma relação bizarra e disfuncional entre duas amigas é Gossip Girl.

O vínculo entre Serena e Blair passa várias temporadas alternando entre o amor e o ódio, contando com planos mirabolantes para salvar ou prejudicar a outra, dependendo da época. A competição passou por questões como quem era a mais popular na escola, quem influenciava mais os outros, quem conquistava o rapaz, quem passava na universidade, quem conseguia o emprego. Basicamente, elas eram melhores amigas e cometeriam crimes uma pela outra, mas não sabiam lidar com o sucesso que não fosse o seu, preferindo destruir a amiga a se deixar ofuscar. E em maior ou menor medida todas as relações entre personagens femininas da série são pautadas em rivalidade (Jenny x Blair, Jenny x Vanessa, Vanessa x Blair, Serena x Vanessa. É inimizade que não tem fim).

Monse e Jamal estão na biblioteca. Ela está brava com alguém que não aparece na imagem e dá dedo para essa pessoa.

É por esse motivo que a parceria entre Monse e Olivia é tão bem-vinda e tão refrescante, sendo construída de forma simples, mas quase transgressora ao colocar duas protagonistas como amigas, sem armadilhas, sem problemas a serem superados, sem grandes questões. Apenas duas meninas amadurecendo lado a lado e se apoiando. Elas já têm muitos problemas para enfrentar e sabem que não precisam ser o problema uma da outra.

Essa amizade é um dos pontos altos de On my block, que conta também com a boa diversidade dentre os personagens e as atuações do elenco jovem, com destaque para a estreante Sierra Capri (Monse) e para Jason Genao (que interpreta Ruby e já atuou também em Logan, Law & Order e The get down).

Ficamos ansiosamente no aguardo da (necessária) segunda temporada e esperamos ver muito mais dessa dinâmica de amizades positivas e enriquecedoras!

Monse, Olívia, César e Ruby se abraçam todos ao mesmo tempo e de olhos fechados.

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

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