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16 dias e 16 séries pelo fim da violência contra as mulheres

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16 dias e 16 séries: Las Mariposas
Las Mariposas

Em 25 de novembro de 1960, o assassinato das irmãs Patria, Minerva e Maria Teresa, na República Dominicana, gerou revolta e mobilização nacional e internacional. As irmãs Maribal lutavam contra a ditadura e fizeram parte de um grupo de resistência que ficou conhecido como Las Mariposas. Em 25 de novembro, foram capturadas desarmadas enquanto visitavam seus maridos na prisão e brutalmente assassinadas. Sua morte é atribuída ao ditador Rafael Leônidas Trujillo.

Em 2001, foi lançado o filme No tempo das borboletas, do diretor Mariano Barroso e baseado no livro de Julia Álvarez. O longa-metragem conta a história das mariposas e traz Salma Hayek como Minerva.

Em 1981, em homenagem às mariposas, ocorreu em 25 de novembro o 1º Encontro Feminista da América Latina e Caribe. E em 1999, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu a data de suas mortes como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher.

Anualmente, essa data marca também o início da campanha mundial de 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres. 16 dias de debates e ações em que órgãos variados se organizam para chamar atenção para a questão da violência contra a mulher e para elaborar estratégias para combatê-la. A campanha começa internacionalmente no dia 25 de novembro e vai até 10 de dezembro, data em que foi proclamada a Declaração dos Direitos Humanos. No entanto, no Brasil, o início da campanha foi antecipado para o dia 20 de novembro, dia da consciência negra, como forma de reconhecer a maior vulnerabilidade da mulher negra à violência e a necessidade de se pensar em ações específicas para protegê-las levando em conta gênero e raça de forma indissociada.

Todo ano existe um tema norteador para direcionar os debates, como uma espécie de slogan da campanha. Os temas dos últimos anos foram: “Machismo. Já passou da hora. #podeparar”; “Não deixar ninguém para trás: acabar com a violência contra mulheres e meninas”; “Pinte o mundo de laranja: geração de igualdade contra o estupro”. Neste ano tão atípico, não encontrei um tema oficial lançado pela Onu Mulheres, mas as instituições têm definido seus próprios temas, muitos deles fazendo referência à violência contra a mulher durante a pandemia do coronavírus e o isolamento social.Em 2016, o Arte Aberta participou da campanha com uma lista de 16 filmes que retratam a violência contra a mulher. Este ano, falamos sobre 16 séries que abordam essa questão, refletindo sobre como o tema é tratado em cada uma delas.

I may destroy you

16 dias e 16 séries: I may destroy you

Arabella (Michaela Coel) é uma escritora e precisa terminar seu primeiro draft em apenas algumas horas. Ela acabou de passar um tempo na Itália como parte de uma vivência para movimentar e inspirar a escrita do seu livro. Ao se trancar no escritório da sua editora para focar seu tempo na escrita e conseguir cumprir o prazo, seu amigo a chama para uma saída com a galera. Após pensar, recusar e conversar, ela acaba cedendo e vai para a noitada. Lá, Arabella bebe com os amigos, e no outro dia, consegue entregar o primeiro rascunho, mas não é exatamente da forma que a editora havia imaginado.

No dia seguinte à noitada, Arabella tem flashes de um homem, e percebe que boa parte da noite foi apagada de sua memória. Ela então percebe que foi drogada propositalmente e sofreu um estupro. A partir daí, Arabella terá que enfrentar o trauma e também lutar com sua vontade de lembrar e não lembrar – ao mesmo tempo – do que sofreu. A narrativa da série nos leva, junto com Arabella, ao processo de enfrentar a violência sofrida, desde ir à delegacia prestar depoimento, até continuar a escrita do livro.

Inacreditável

16 dias e 16 séries: Inacreditável

A minissérie é baseada em um caso real ocorrido nos Estados Unidos em 2008. Marie estava dormindo quando um homem invadiu sua casa, a amarrou com os cadarços de seu próprio tênis, a estuprou e tirou fotos de seu corpo. Ao denunciar a violência, Marie foi desacreditada pelos policiais. Eles apontaram inconsistências em seu relato e passaram a tratá-la como suspeita ao invés de vítima, o que a deixou nervosa e fez com que as inconsistências aumentassem. A jovem teve que responder judicialmente pelo crime de falsa denúncia e foi publicamente exposta e criticada.

Anos depois, em outras investigações, duas policiais perceberam similaridades entre vários casos de estupro não solucionados e acreditaram tratar-se de um estuprador em série. Em uma corrida para evitar que ele agisse novamente, as duas investigadoras conheceram e entrevistaram várias das vítimas e tentaram compreender como o criminoso costumava agir. A investigação as aproximou de Marie.

O seriado, além de tratar de forma central do estupro, mostra como o sistema de justiça pode perpetuar as violências sofridas pelas vítimas, com entrevistas e perguntas repetitivas e desnecessárias, exames invasivos e equipe descuidada e despreparada. Mostra também os perigos e consequências de não se acreditar na vítima e de expô-la publicamente. Além da problemática de se estabelecer uma forma “única” de como as vítimas de estupro deveriam se comportar, desconsiderando suas individualidades e as diversas formas possíveis de reação.

Em contraponto, a série mostra como o trabalho das duas investigadoras foi determinante para a solução do caso, e como elas e alguns outros funcionários (ainda que de forma isolada) tentam em seu dia a dia enfrentar esse sistema opressor e machista, lidando de forma respeitosa e sensível com essas mulheres.

Grand Army

16 dias e 16 séries:

A série acompanha o dia a dia de uma turma de adolescentes no Ensino Médio. Além das questões de cada um, com vários focos e narrativas, o seriado aborda especialmente o machismo e a violência contra a mulher a partir do núcleo da personagem Joey.

Forte e empoderada, ela é vista por todos como uma jovem bem à vontade com seu corpo e com seus desejos, o que gera admiração de alguns e julgamento de outros. Repreendida por usar roupas curtas na escola, ela lidera um movimento que mobiliza centenas de colegas a irem sem sutiã em um dia de aula, o que gera uma grande repercussão na comunidade escolar. Ela faz o que quer, se veste como quer, fica com quem deseja e se mostra inabalável com as críticas (apesar de ser possível perceber que algumas delas a afetam em determinado nível).

O que começou como uma imagem de liberdade e empoderamento é transfigurado em um estereótipo machista que a aprisiona e a limita. Quando denuncia um estupro, seus colegas e amigos não acreditam nela. Questionam as suas atitudes, as liberdades que dava aos amigos e as brincadeiras que fazia. A veem como alguém que nunca nega sexo, que consente com qualquer coisa e que é permissiva com seu corpo. Além de violentada e traumatizada, ela é desacreditada e julgada como mentirosa, perdendo os amigos, a escola e os lugares que frequentava.

O seriado descreve uma situação em que a vítima se sentia segura e confiava nos abusadores e passa por um processo traumático de ter que conviver com eles após a violência, exposta a uma lógica distorcida de culpabilização da vítima e de associação do crime (que não é encarado dessa forma) à uma atitude promíscua da mulher, o que gera nela confusão, culpa e solidão.

A série analisa como a sociedade (e em especial a juventude) tem tramitado de forma tênue entre enaltecer o feminismo e o empoderamento e repreender as liberdades, especialmente a liberdade sexual, que vem com esse empoderamento. Com uma facilidade muito grande, a jovem que foi elogiada no dia anterior por sua liberdade é hoje tachada de puta pelas mesmas atitudes. E uma comunidade escolar que se uniu para criticar o machismo do colégio divide-se ao questionar a credibilidade de uma vítima de estupro.

Outlander

16 dias e 16 séries

Muito se poderia falar sobre os casos de estupro em Outlander. Afinal, praticamente todos os personagens foram estuprados ou escaparam por pouco de tentativas de estupro. Essa é uma violência repetida diversas vezes ao longo da série, a ponto de fazer muitos espectadores questionarem qual é a intenção da obra. Alguns dizem que se trata de “fidelidade histórica”, uma vez que a série retrata épocas e contextos muito perigosos. Cabe destacar, no entanto, que a série tem como premissa a viagem no tempo, o que já derruba, desde o início, qualquer teoria sobre a necessidade de realismo na obra.

Outra violência que chamou atenção de forma muito negativa ocorreu logo na primeira temporada. O problema veio não só da violência em si, mas da forma como a narrativa foi desenvolvida. Cabe destacar que Outlander, especialmente nas primeiras temporadas, é centrado na rivalidade entre o protagonista herói e um vilão cruel. Eles seguem esses papéis bem determinados no imaginário do espectador: o homem bom versus o homem mau. O vilão estupra, mata, tortura e o herói não (ele mata apenas para se defender ou proteger quem ele ama). Todos se apaixonam pelo protagonista, um homem bonito, viril, corajoso, ao mesmo tempo sensível e visivelmente apaixonado.

Entretanto, na primeira temporada, ele protagoniza uma cena digna de vilão! E pior: isso não é criticado e nem desenvolvido na narrativa. Em determinado momento, Claire é orientada a ficar escondida e não segue a ordem, acreditando que poderia ajudar seus amigos e seu marido durante um momento perigoso. Ela é capturada pelo exército inimigo e levada até Randall, o vilão. Prestes a ser estuprada, Jaimie aparece e a salva, contando com a ajuda de seus companheiros. Tudo dá certo e eles fogem, apesar de agora estarem sob a mira de Randall.

Aliviada, Claire acredita que o problema terminou, mas Jaimie a acusa por tudo que aconteceu. Não somente por seus homens terem sido colocados em perigo, mas a acusa de quase ter sido estuprada para puni-lo (por um outro estupro do qual ele não conseguiu defendê-la). Ele literalmente diz que ela se arriscou de propósito para gerar nele a agonia de vê-la ser estuprada! Ao falar sobre o sentimento apavorante de ver a esposa quase sendo estuprada, ele senta, treme e chora. E a vítima do quase estupro o consola e pede desculpas.

Não bastasse esse absurdo, ambos se perdoam (oi?), mas o grupo ainda precisa que ela seja punida por tê-los colocado em risco. Para provar sua masculinidade e posição de liderança, Jaimie “precisa” dar uma surra na esposa, para que ela aprenda que deve obedecer às ordens e não expor o grupo ao perigo. 

“Abaixe-se do lado da cama e levante o vestido, mulher (…) Há uma diferença entre entender algo na sua mente e realmente saber como é, lá no fundo. Eu sei por experiência própria que uma boa surra faz você enxergar de um ponto de vista mais sério (…) A justiça existe, Claire. Você agiu errado com todos os homens e deve sofrer por isso. Eu sou seu marido. É meu dever resolver isso (…) Espero que ouçam você gritar na aldeia vizinha (…) Se posso perdoá-la pelo que fez [desobedecer uma ordem e quase ser estuprada], você pode me perdoar também, assim que puder se sentar de novo”.

À força, ele a derruba no chão, luta com ela, levanta seu vestido e lhe dá uma surra de cinto. Todo o grupo aprova e no dia seguinte fazem piadas e riem por ela não conseguir se sentar devido aos machucados. Após um breve período de raiva, marcado especialmente pela punição de “negar sexo”, ela o perdoa quando ele promete nunca mais levantar a mão para ela. As pazes são seguidas por uma tórrida cena de sexo e o assunto nunca mais é mencionado. A história de amor entre os dois é considerada épica e uma das mais sensuais do audiovisual. Como já dito anteriormente, Outlander conta com muitas cenas de violência, mas a grande maioria delas é mostrada de forma bem demarcada como sendo negativa, associada aos vilões e sendo repreendida. Mas tanto a culpa que Jaime atribui à Claire quanto a violência física que ele comete contra a esposa ficam em um limbo moral, ao qual os espectadores não sabem como reagir e acabam relevando (o famoso “passar pano”) pelo fato de achar que as ações gerais do protagonista compensam esse “pequeno incidente”, além da promessa de que aquele ato não vai mais se repetir. Uma cena que muitos não perdoariam se tivesse partido de outro personagem ou se tivesse acontecido na vida real, mas que envolto na aura de simpatia de um protagonista bonito e apaixonado passa ileso. Mensagem extremamente perigosa!

As telefonistas

16 dias e 16 séries

A série espanhola Las chicas del cable (As telefonistas, em português) narra o encontro entre quatro mulheres que se conhecem em uma companhia de telefonia, no final da década de 20, e tornam-se grandes amigas. Enquanto três delas estão em seu primeiro dia de trabalho como telefonistas, Ângeles é a supervisora. Gentil e bondosa, ela ajuda a todos com muita simpatia e boa vontade. Ninguém imagina que em casa ela vive um pesadelo.

Seu marido também trabalha na companhia e quer que ela abra mão de seu cargo para cuidar da casa. Ângeles ama seu trabalho e sente-se motivada com as possibilidades de crescimento que lhe são ofertadas. Como ela se recusa a parar de trabalhar, o marido usa da violência para tentar convencê-la. Constantemente agredida, traída e humilhada, é ao lado das amigas que ela se fortalece e pensa em formas de sair desse casamento, garantindo sua segurança e a de sua filha.

Cabe destacar que a história de Ângeles não é a única que envolve violência na série. No início do primeiro episódio, a narradora contextualiza a vida das mulheres na Espanha que antecedeu a ditadura Franquista. Todas as protagonistas, em maior ou menor medida, enfrentam o machismo e suas formas violentas de controle. Impedidas de trabalhar, de amar quem quisessem, de lutar pelo que acreditavam, elas eram ameaçadas constantemente. E a série mostra, de forma certeira, diversas ocasiões em que elas se ajudam e se protegem, sendo a amizade uma estratégia poderosa de sobrevivência.

13 reasons why

16 dias e 16 séries

Em sua primeira temporada, 13 reasons why recebeu diversas críticas pela forma como lidou com a temática do suicídio, inclusive pela forma gráfica com que mostrou a morte da protagonista, uma cena dificílima de assistir. Pouco se falou, no entanto, sobre os vários casos de estupro na série e sobre o retrato também gráfico dessas violências.

A série acompanha uma turma de colegas do Ensino Médio e, a partir do suicídio de uma das adolescentes, investiga a dinâmica entre esses jovens, com foco especial nas violências, no machismo e na solidão.

Cabe destacar que as violências, inclusive o estupro, não foram sofridas apenas pelas mulheres na série. Mas, no caso delas, é mostrado um sistema complexo que corrobora e acoberta os abusos e do qual a maior parte da comunidade escolar participa (inclusive professores, orientadores e diretores), alguns de forma consciente, outros não.

Além dos estupros em si, o programa revela diversas atitudes violentas que marcam o dia a dia daqueles jovens, como a divulgação de fotos íntimas sem autorização; listas que objetificam as mulheres e as colocam em rankings sexuais sem sua autorização ou participação; o acobertamento de abusadores como política de camaradagem; toques no corpo feminino sem autorização; assédio; apelidos; difamações; tudo criado para objetificar e expor as mulheres (nesse caso adolescentes!). Ações abertamente conhecidas por todos e com aliados entre as próprias mulheres, entre os docentes, entre os “bons” alunos e entre os pais, tratadas como brincadeiras de jovens e não como violências.

Toda essa cultura, considerada por muitos como “inofensiva”, no seriado escalona para estupros. 13 reasons why retrata um estupro cometido dentro de um relacionamento e a dificuldade de reconhecê-lo como tal; retrata estupro com conivência dos amigos e do próprio namorado da vítima, em uma priorização do “coleguismo masculino”; retrata estupro com pedido de socorro que foi ouvido e ignorado; estupro que foi a julgamento e que foi revertido para culpabilização da vítima; estupro com a vítima inconsciente; estupro com a vítima na casa de alguém que considerava um amigo; estupro que foi questionado pelo adulto responsável; estupro em que a vítima não conseguiu denunciar. Foram muitas situações retratadas, além de uma diversidade de reações por parte das vítimas.

Cabe destacar que a maior polêmica envolvendo cenas de estupro na série foi referente ao estupro de um personagem masculino. O episódio gerou revolta e ameaças de cancelamento do seriado. Sabe-se que o estupro masculino envolve ainda mais tabus do que o feminino, com o questionamento da virilidade da vítima, o receio ainda maior de denunciar e tornar o caso público. Sem minimizar a violência e o sofrimento da vítima (nem negar que a cena é absurdamente nauseante), pode-se questionar porque em um programa com tantas cenas de estupro contra mulheres, o estupro masculino gerou reações bem mais extremas de repulsa e revolta por parte dos espectadores.

Anne with an E

16 dias e 16 séries

Anne with an E aborda de forma sensível e inteligente diversos temas necessários, tornando-os acessíveis ao público jovem. Dentre essas várias questões, a obra tem um foco especial no combate ao machismo e, em sua última temporada, centralizou o debate na violência contra a mulher.

Apesar de ser muito jovem, uma das colegas de Anne está noiva. Josie Pye e Billy estão com compromisso firmado em uma aliança estipulada por seus pais. Durante um baile que ocorre na cidade, Billy convida Josie ao jardim, longe das vistas de todos, e contra a vontade da moça toca em seu corpo e tenta forçar uma aproximação maior. Assustada, ela foge. Diante da recusa e com muito despeito, Billy volta para a festa e difama Josie para os amigos, inventando que eles transaram no jardim.

O boato logo corre pela cidade e o julgamento de todos recai sobre Josie, sem que haja nenhuma crítica ao comportamento de Billy. A família e as amigas a culpam. Outros minimizam: “não é tão ruim assim. Eles são praticamente noivos”. Inconformada com o que escuta, Anne não entende porque a discussão está girando em torno da reputação da moça e não da violência que ela sofreu. A protagonista insiste diante de todos que o noivado não dava nenhum direito ao rapaz e que era necessário consentimento para que acontecesse qualquer coisa. Questiona ainda porque a reputação de Josie está arruinada e a de Billy não está. 

“Não é preciso uma bola de cristal para ver que Josie Pye é a vítima!”, Anne grita em sua simplicidade e clareza. Ignorada por todos e muito revoltada com o ocorrido, ela não aceita ficar calada e escreve um texto sobre o assunto (sem autorização) no jornal da cidade.

Escreve sobre o desrespeito sistemático que a sociedade direciona às mulheres, retirando delas a autonomia sobre seus próprios corpos. Escreve ainda sobre as diferenças de tratamento direcionadas aos meninos e às meninas e convida todos a imaginarem como seria um mundo mais igualitário. A leitura choca a pequena cidade e deixa todos em polvorosa, resultando na proibição do jornal.

Os jovens então se juntam para lutar contra a censura e, no processo, reveem algumas questões. O mais importante é que a própria Josie passa a ver a situação de uma forma diferente e se fortalece para enfrentar Billy e o julgamento dos demais.

Bom dia, Verônica

16 dias e 16 séries

Essa série brasileira, adaptação do livro de mesmo nome, conta a história de Verônica, uma escrivã da polícia que participa de uma investigação para pegar um criminoso que tem aplicado diversos golpes de “boa noite, Cinderela”. Ela se envolve pessoalmente com o caso, ultrapassando alguns limites profissionais para pegar o estuprador. Nesse processo, ela conhece Janete, uma dona de casa solitária que parece esconder um segredo.

Ao tentar ajudá-la, Verônica entende que ela sofre violência física, psicológica e patrimonial por parte do marido. Completamente controlada por Brandão e isolada de todos, Janete não tem dinheiro próprio, nem permissão para fazer ligações, nem para entrar em contato com a família ou com qualquer conhecido. À medida que as violências escalonam, Janete revela à Verônica um segredo obscuro: ela não é a única vítima de Brandão. Em uma corrida para impedi-lo, Verônica descobre que não pode contar com a polícia e passa a agir sozinha.

Além da fotografia extremamente gráfica ao mostrar cenas de tortura (o que torna dificílimo de assistir), o seriado tem de forma geral um tom negativo e preocupante. A mensagem passada aos espectadores parece ser uma descrença generalizada no sistema de justiça e no poder da denúncia, o que pode ter efeitos calamitosos na vida real. Descrevemos melhor essas preocupações em um outro texto.

Disque amiga para matar

16 dias e 16 séries

Dead to me (Disque amiga para matar, no Brasil) narra a aproximação de duas mulheres que se conhecem em um grupo de apoio para pessoas em luto. Judy esconde muitos segredos e também muitos traumas. Antes de conhecer Jen, ela viveu um histórico de abusos.

Após ser negligenciada e explorada pela mãe durante muitos anos, ela cresceu solitária, carente e machucada. Já adulta, viveu um relacionamento abusivo com Steve e precisou de muito tempo e ajuda para entender que de fato aquela era uma relação desequilibrada e negativa. A série permite ao espectador ir conhecendo aos poucos como era a dinâmica dos dois e percebendo que a violência pode não ser necessariamente física, nem mesmo óbvia, mas que está claramente lá, acabando com a autoestima daquela mulher, com sua saúde mental e com seu equilíbrio.

Steve é manipulador e usa os sentimentos de Judy para controlá-la. Ele estimula sua dependência emocional e constantemente dita o que ela deve fazer ou falar. De forma proposital, mina sua autoconfiança e desmerece todas as suas opiniões. Tanto em público quanto de forma privada, a trata como louca, instável e histérica, e faz com que todos (inclusive ela própria) questionem sua sanidade e a veracidade/pertinência do que ela fala. Essa técnica de abuso psicológico é conhecida como gaslighting.

Mesmo após o fim do relacionamento, Judy continua sofrendo com os efeitos dessa violência, duvidando de si mesma e acreditando que não é merecedora de amor. Mas a amizade de Jen e seus filhos aos poucos a fortalecem. Com o tempo, ela vai trabalhando a dificuldade de se impor, aprendendo a dizer “não” para as pessoas e a respeitar e priorizar suas necessidades e vontades.

Jessica Jones

16 dias e 16 séries

A primeira temporada de Jessica Jones da Marvel/Netflix, lançada no final de 2015, traz exemplos, explicações e metáforas sobre a cultura do estupro de forma gráfica!

Imagine uma mulher com superpoderes, com uma força extraordinária, pulos inimagináveis e uma rápida cicatrização. Com esses poderes, viveríamos mais livres? Poderíamos sair nas ruas, à noite, sem olhar para trás ou para a próxima esquina, verificando se estamos seguras? Mas neste mundo onde superpoderes são possibilidades surge um vilão que pode dominar sua mente, e daí suas ações. E toda aquela segurança se esvai. A sua força física não conta mais – ou conta contra você mesma.

Kilgrave (David Tennant), que controla mentes, é um vilão assustador exatamente por representar o abusador que nós mulheres tememos, aquele que nos envolve, nos domina e confunde a nossa mente em relação às nossas próprias ideias do que de fato está acontecendo. Jessica (Krysten Ritter) traz, porém, de forma explícita, o que ele fez com ela. Sim, foi estupro!

Jessica Jones está disponível na Netflix e possui três temporadas. A anti-heroína continua lidando com outros vilões e outros traumas que envolvem essa cultura sexista na qual estamos inserida.

You

16 dias e 16 séries

Com um passado de abusos físicos e psicológicos, Joe Goldberg cresceu obcecado com a necessidade de amor e proteção. Já adulto, ele recorrentemente se envolve em relacionamentos abusivos, marcados por idealizações de suas parceiras e uma extrema necessidade de controle sobre suas vidas.

Pelo ponto de vista dele, acompanhamos como se desenvolve sua obsessão e como ele chega às últimas consequências para forçar uma aproximação e um relacionamento. Como ele fantasia sobre seus interesses amorosos sem deixar espaço para a realidade, que obviamente envolveria defeitos e vontades diversas das dele. Em um esquema invasivo e perturbador, ele persegue essas mulheres, na vida real e nas redes sociais, descobrindo pistas que o permitam se aproximar e que o ajudem a aliená-las de seus amigos e familiares, dando um jeito de retirar um por um de suas vidas, até que reste somente ele.

De forma distorcida, ele se convence de que tudo que faz é necessário. Acredita que age por amor e para protegê-las de outros perigos. Com o tempo, vai sendo obrigado a questionar algumas de suas atitudes, confrontado com a dúvida sobre ser bom ou mau e querendo muito acreditar que não é um vilão.

Ao abordar o uso das redes sociais como forma de captação de tantas informações essenciais, a série é extremamente atual e nos deixa alertas sobre os riscos desse tipo de invasão. Cabe destacar, no entanto, que por mais que seja positivo e necessário tomar cuidado com as informações disponibilizadas nesse tipo de rede, é preciso cuidado para não se atribuir a culpa desse tipo de perseguição às usuárias das redes sociais. Na série, Joe consegue as informações das mulheres a partir de seus perfis públicos, mas quando elas têm contas fechadas isso não o impede. Ele as observa quando não fecham as cortinas de casa, as segue na rua, no trabalho, invade seus apartamentos quando elas não estão, hackeia seus celulares. Então é importante compreender que, por mais que possamos tomar os devidos cuidados, a culpa do ato criminoso é exclusivamente do perseguidor.

Aqui cabe um spoiler (alerta!): na segunda temporada, Joe estava cada vez mais imerso na dúvida sobre a validade de seus atos e, por causa de um crime específico, ele finalmente foi obrigado a encarar e aceitar sua culpa. Ele confessou seus crimes e estava disposto a se entregar para a polícia. Mas os roteiristas optaram por fazer com que ele não fosse culpado por aquela violência específica (apesar de ser responsável por outras várias), o que destruiu seu processo de auto aprendizado e o fez voltar a não assumir responsabilidade por seus atos. Tudo por uma terceira temporada. Uma pena.

Big little lies

16 dias e 16 séries: Big little lies

Na pequena e elitizada cidade de Monterey, todos parecem ter uma vida perfeita. Especialmente Celeste e Perry Wright. Eles formam um casal que desperta inveja em toda a comunidade. Belíssimos, ricos, com um par de filhos encantadores e uma casa enorme. Todos comentam que, mesmo após anos de casamento, eles ainda são tremendamente apaixonados e parecem viver em uma eterna lua de mel.

O que os outros não veem, no entanto, é que o relacionamento dos dois é repleto de desequilíbrios e violências. Para a comunidade, Perry é um homem bem sucedido, educado, marido apaixonado e pai amoroso e presente. Em casa, é um homem ciumento, violento e controlador.

Frequentemente, a paixão que todos admiram escalona para sexo agressivo e perigoso, que costuma deixar machucados e muita vergonha. Celeste ama seu marido e não sabe como lidar com essa vida sexual que envolve tanta agressividade. Ao começar a trabalhar essa questão na terapia, várias outras camadas de seu relacionamento vão sendo analisadas.

Celeste é uma advogada talentosa e tinha um futuro brilhante pela frente, mas foi impedida de trabalhar pelo marido. Perry controla seus gastos, suas ações, suas amizades. E muitas vezes a machuca, com puxões no braço, tapas, socos, empurrões, o que algumas vezes acaba se transformando em sexo tórrido, o que a deixa muito confusa e envergonhada. Em seguida, ele pede perdão, chora, traz presentes, vai para a terapia de casal e se mostra calmo, romântico e dócil. Mais do que o resto, sua relação carinhosa com os filhos, as brincadeiras, os momentos juntos, fazem com que ela se convença de que ele não é mau. Até que tudo se repita.

É através dos filhos, e pensando em como isso pode afetá-los, que ela tenta interromper esse ciclo de violências. No entanto, no âmbito da  justiça, começam outras tantas agressões. Sua vida é exposta, todas as suas ações são julgadas, sua vida sexual é destrinchada e até a sua habilidade como mãe é questionada. Ela precisa, mais uma vez, juntar todas as suas forças para combater um sistema falho e perverso que insiste em culpabilizar as vítimas ao invés de protegê-las.

Ela quer tudo

16 dias e 16 séries: Ela quer tudo

“Sei que mora na rua de baixo, mas me liga (quando chegar)”.

É assim que uma amiga de Nola se despede dela, no primeiro episódio da série Ela quer tudo. Elas sabem que, independentemente do trajeto ser curto, mulheres estão inseguras ao andar sozinhas na rua (a qualquer horário, mas especialmente à noite). Quantas vezes nos despedimos das amigas com pedidos semelhantes?

Infelizmente, nesse episódio, a protagonista da série passa por uma situação assustadora. Ao ir para casa, é abordada por um homem desconhecido na rua.

“Gostosa, qual é o seu nome? Ei, madame!”

Ele grita por ela, a segue e insiste no assédio, mesmo quando ela não se vira, quando apressa o passo e quando pede que a deixe em paz. Ele a puxa pelo braço, segura seu pulso e de forma agressiva a chama de vadia. Se achando coberto de razão, briga por ela não ter lhe dado atenção. Age (como muitos fazem) como se a vítima fosse mal educada por não responder ou reclamar do abuso.

Após muitos puxões, Nola consegue se soltar e corre desesperada. À distância, o homem a xinga. Na segurança de sua casa, ela senta, treme e chora. E as espectadoras, que muito provavelmente já vivenciaram alguma situação parecida (em algum nível), entendem seu medo, sua revolta e a angustiante sensação de insegurança e falta de controle.

No dia seguinte, Nola transforma todos aqueles sentimentos em uma campanha de arte de rua. E, de forma anônima, cola pela cidade diversos cartazes com imagens e frases contra o assédio. Comprovando o quanto as mulheres compartilham dessa mesma frustração, a campanha de Nola faz muito sucesso e a cidade fica em polvorosa para descobrir quem é a artista.

Orange is the new black

A série Orange is the new black narra o dia a dia em uma penitenciária feminina nos Estados Unidos. Apesar das violências carcerárias serem um problema geral que também atinge as instituições masculinas, nesse seriado o espectador tem contato com diversos exemplos em que a questão de gênero e o desequilíbrio de poder entre homens e mulheres é determinante para a opressão.

Na penitenciária de Litchfield, os principais detentores de poder são homens. Guardas, orientadores e médicos. Apesar de ao longo das temporadas a instituição ter algumas mulheres em posição de liderança, normalmente são os homens que lidam diretamente com as detentas. São eles que decidem quem vai para a solitária, quem receberá remédios, visitas, empregos, quem receberá advertências e relatórios negativos (que podem afetar a duração da pena).

Confortáveis com esse poder, os funcionários frequentemente usam seus cargos como moeda de troca, escolhendo o que relatar e o que deixar passar, se aproveitando disso para abusar das mulheres sob seu domínio.  Elas são humilhadas, ofendidas e assediadas. Não por um funcionário, mas por vários. Alguns são obviamente misóginos e sádicos. Outros consideram-se exemplares mas aparentemente não compreendem como o desequilíbrio de poder que existe em uma convivência como aquela ameaça a autonomia das mulheres, não sendo possível existir uma relação entre guarda e detenta de igual para igual, equilibrada e saudável.

O mais evidente de todos os casos parte de um guarda chamado Mendez, que se aproveita da vulnerabilidade de diversas detentas para exigir sexo em troca de drogas ou para não denunciá-las por algo que descobriu. Sem caráter, ele não se importa com as regras da prisão, nem com justiça ou reabilitação. Ele usa seu poder ali dentro para estuprar e subjugar as detentas, além de ganhar dinheiro contrabandeando drogas para dentro da prisão.

De forma menos óbvia, na primeira temporada, o guarda Bennett se aproxima de uma detenta que acabou de chegar em Litchfield e ambos acreditam estar apaixonados. Quando Daya descobre que está grávida, Bennett sabe que será penalizado judicialmente e foge, o que deixa claro que ele tinha consciência da impossibilidade desse tipo de envolvimento impróprio.

Já na terceira temporada, conhecemos um pouco mais sobre o passado de Tiffany Dogget (conhecida também como Pennsatucky). Com um extenso histórico de abusos sexuais, problemas psicológicos e vício em drogas, Dogget desenvolveu uma relação triste com o sexo. Ela foi ensinada desde muito nova (por sua mãe e pelo mundo) a não resistir a abusos e a tratar o sexo como barganha. Ela cresceu encarando o sexo como algo desassociado do prazer e relacionado à submissão.

Nessa temporada ela realiza algumas atividades fora da prisão dirigindo a van da instituição. Nesses momentos, é acompanhada por um guarda que fica responsável por ela. Aos poucos, eles vão conversando, se conhecendo e desenvolvendo uma aparente relação de amizade. Ele a deixa desviar da rota para fazer alguns passeios divertidos e lhe dá donuts, criando uma atmosfera de gentilezas em que ela se sente confortável e privilegiada. No entanto, se aproveitando da vulnerabilidade de Dogget e distorcendo a relação entre eles, o guarda a estupra, tratando aquilo como se fosse uma espécie de romance. Confusa e desconfortável, por um longo período ela fica sem saber como agir.

Assim como essas situações, o seriado mostra ao longo de suas temporadas diversas outras violências intimamente relacionadas a questões de gênero e decorrentes do desequilíbrio de poder entre mulheres encarceradas e homens que detêm as escolhas sobre sua segurança, seu bem estar e sobre as questões mais básicas da sua sobrevivência.

Alias Grace

O seriado narra uma história real ocorrida no Canadá em meados do século 18. Uma jovem de 16 anos foi condenada por dois assassinatos e dividiu a opinião pública. Enquanto muitos a consideravam perversa, outros defendiam sua inocência e outros argumentavam que ela havia sido vítima das circunstâncias, merecendo um novo julgamento.

Grace viajou da Irlanda para o Canadá com os pais e os irmãos mais novos em busca de melhores condições de vida. A mãe morreu a bordo do navio e todos os abusos e violências (físicas e sexuais) do pai se direcionaram para ela, a filha mais velha. Fugindo dele, arranjou trabalho como empregada doméstica e nunca mais viu a família. Nesse emprego conheceu Mary, uma jovem alegre, divertida e generosa e elas se tornaram inseparáveis.

Com o tempo, Grace descobre que Mary é assediada pelo filho dos donos da casa, que prometeu casamento dissimuladamente com o único objetivo de transar com ela. Grávida e abandonada, Mary recorre a um homem que faz abortos clandestinos. Gasta todas as suas economias (e as de Grace) e realiza o procedimento em condições assustadoras e sem nenhuma segurança. Em decorrência disso, morre naquela mesma noite.

Devastada, Grace tem ainda que lidar com as investidas de George, o filho dos patrões, que agora a vê como um novo alvo. Para escapar, ela aceita um emprego na fazenda do Sr. Kinnear. No entanto, os perigos não param.

À medida que o novo patrão se interessa mais por Grace, Nancy, a governanta e amante de Kinnear, tem receio de perder seu posto para uma mulher mais jovem. Grávida, ela teme ser abandonada e corre o risco de ter um destino igual ao de Mary. Desesperada e com ciúmes, ela torna a vida de Grace um inferno.

Com o assassinato da governanta e do patrão, Grace é presa e passa décadas entre a prisão e o hospício, sofrendo diversas agressões, torturas e abusos. Ela afirma não se lembrar de nada, o que faz com que os defensores de sua inocência contratem um psicanalista para avaliá-la.

Em suas consultas, vamos conhecendo a história da protagonista. E mais do que determinar sua culpa ou inocência, o espectador tem acesso às diversas violências que Grace e as demais mulheres sofriam naquela sociedade. Violência doméstica, abuso sexual dentro de casa, assédio no trabalho, gravidez desamparada, aborto inseguro, estupro na prisão e nos manicômios.

A vida de Grace é um emaranhado de violências e, ao mesmo tempo em que não sabemos se ela é culpada ou não, temos certeza de que é vítima, pelo simples fato de ser mulher.

The handmaid’s tale

Difícil falar sobre violência contra a mulher em séries e não falar sobre o Conto da aia (The handmaid’s tale). Afinal, a obra se passa em uma sociedade inteiramente organizada para controlar e oprimir as mulheres.

Na história, os Estados Unidos sofreram ataques coordenados liderados por organizações extremistas que desejavam dar novos rumos para o país e para a sociedade. Assim, os EUA tornaram-se a República de Gilead e um novo governo foi instaurado. O poder dominante é extremamente misógino, homofóbico, conservador e controlador.

As regras aos poucos vão sendo aplicadas e gerando enormes mudanças, especialmente para as mulheres. Fica decretado que elas são proibidas de trabalhar, são também proibidas de movimentar contas financeiras, ler, escrever e andar desacompanhadas. Completamente dominadas e sem autonomia, elas não conseguem sair do país e ficam à mercê dos homens (de seus maridos, pais e irmãos, mas principalmente do governo).

Com o tempo, elas são divididas em categorias, de acordo com a sua “contribuição” para aquela sociedade. Mulheres para parir filhos, mulheres para cuidar da casa, mulheres com quem se casar, mulheres com quem transar em bordéis e mulheres “descartáveis” para exercer trabalhos extremamente perigosos e mortais, como limpar lixo radioativo nas colônias.

A bem da verdade, todas elas são tratadas como descartáveis e como cidadãs de segunda classe. Mesmo as esposas, que detém “privilégios” que as outras não possuem, são completamente controladas e submissas à essa estrutura, limitadas em suas vontades e direitos.

Acompanhamos a série pelo olhar de June, uma mulher que foi sequestrada, separada de sua filha e seu marido e obrigada a agir como aia. Esse grupo representa as poucas mulheres que ainda são férteis. Elas são dadas de presente a militares para serem estupradas mensalmente e parirem seus filhos. Logo após o nascimento, são brutalmente afastadas desses bebês e enviadas para novas casas e novos comandantes. Tanto as aias quanto as outras categorias de mulheres, em maior ou menor medida, são torturadas, violentadas e submetidas a múltiplas agressões. São completamente destituídas de autonomia, direitos e liberdade.

A série representa um mundo apocalíptico, conservador e assustador que parece muito distante em um primeiro momento, mas que infelizmente apresenta muitas similaridades com o nosso próprio mundo. Acompanhamos como Gilead se formou, com a anuência e/ou omissão de grande parte da população e com o apoio de muitos dos maridos, dos irmãos e das próprias mulheres. Como o discurso dos políticos e dos líderes religiosos contaram com milhares de ouvintes que encontraram lógica naquela doutrinação. Vemos como, aos poucos, cada uma daquelas leis que retiravam a autonomia das mulheres foram sendo aceitas, algumas até mesmo parecendo sensatas para algumas pessoas. Até o ponto em que tudo estava fora do controle e já era tarde demais.

É assustador ver na vida real pessoas reclamando dos direitos humanos, minimizando abusos e violências, desacreditando vítimas de agressão e defendendo a retirada de direitos de determinados grupos. Vemos nessas ocasiões como Gilead não está tão distante assim e somos lembradas de que nossos direitos não são garantias perpétuas, precisando ser constantemente defendidos e assegurados.


Texto com colaboração de Risla Miranda e Lina Távora.

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

Uma resposta em “16 dias e 16 séries pelo fim da violência contra as mulheres”

[…] Tentando mudar essa situação, em 1991 foi estabelecida uma estratégia anual de mobilização e engajamento para prevenir e tentar eliminar a violência contra mulheres e meninas. Todos os anos, o período de 20 de novembro a 10 de dezembro é marcado no Brasil por uma campanha de 16 dias de ações para conscientização da temática, envolvendo debates, manifestações e produção de conteúdo. […]

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