Apesar de, para muitos, o Dia da Educação ser comemorado em 28 de abril, desde 2018 as Nações Unidas estabelecem 24 de janeiro como International Day of Education. Essa data tem como intenção celebrar o papel da educação e sua importância para a paz, a igualdade e o desenvolvimento sustentável.
Para a organização mundial, estabelecer datas comemorativas como essa é importante para educar e mobilizar o público em torno de assuntos importantes, comemorando as conquistas já alcançadas e chamando atenção para necessidades ainda prementes. A intenção é convidar organizações oficiais e não oficiais a pensarem sobre aquele tema e sobre como podem ajudar a causa.
Com isso em mente, o Arte Aberta listou algumas obras audiovisuais dirigidas por mulheres que têm como tema principal a educação formal. São filmes e séries, nacionais e internacionais, que podem permitir novas visões sobre a educação, especialmente por trazer contextos tão variados e possivelmente diferentes dos experienciados pelo espectador.
Daughters of destiny – diretora Vanessa Roth
A série documental está disponível na Netflix em quatro capítulos e retrata a realidade da educação na Índia. A obra foi filmada ao longo de sete anos e acompanha cinco meninas que moram e estudam no colégio Shanti Bhavan (Morada da paz).
O internato foi criado com a proposta de selecionar crianças em situação de extrema vulnerabilidade. Além de lhes proporcionar os conteúdos curriculares da educação formal e aulas extracurriculares como teatro, dança e música, também tem como objetivo incentivar e fortalecer sentimentos de liderança e confiança, para que se formem profissionais competentes, talentosos e capazes de mudar a realidade de sua comunidade.
Apenas uma criança de cada família pode ir para a escola e é considerada uma grande honra ser selecionado. Os jovens devem ser matriculados aos quatro anos de idade e só saem já adultos, ficando longe de suas famílias durante anos.
Daughters of destiny acompanha sete anos da vida das jovens Thenmozhi, Manjula, Preetha, Shilpa e Karthika, tanto na escola quanto nas visitas às famílias durante as férias. Acompanhamos o contraste evidente na dualidade escola x casa e a forte relação entre as jovens e suas mães. Cada uma delas conta histórias pessoais sobre sua família e sua vida antes e depois de Shanti Bhavan, permitindo ao espectador aprender sobre a Índia, seu sistema de castas e sua realidade social e educacional.
Muito se pode também entender sobre as dificuldades e preconceitos pelos quais as mães indianas passam para sustentar suas famílias (muitas vezes sozinhas) e para garantir que as filhas tenham direito à educação, em um país ainda muito machista que vê o casamento como o único futuro para meninas.
Brave girl rising – diretores Martha Adams e Richard Robbins
O média-metragem foi realizado como parte de uma campanha global em prol da educação e do empoderamento de meninas. O projeto, chamado Girl rising, em 2013 contou a história de nove meninas ao redor do mundo, sob o olhar de nove cineastas. Cada uma das protagonistas teve sua história contada por roteiristas de seu próprio país e cada filme contou com a narração/dublagem de atores internacionalmente conhecidos.
As obras anteriores nos apresentaram as realidades de meninas de Serra Leoa, Haiti, Etiópia, Afeganistão, Peru, Egito, Nepal, Índia e Camboja. Agora, Brave girl rising nos apresenta os refugiados de Dadaab, no Quênia, próximo da fronteira com a Somália, de onde é a protagonista Nasro.
O média-metragem conta a história de uma adolescente de 17 anos que está vivendo em um dos maiores campos de refugiados do mundo e um dos lugares mais perigosos para meninas e mulheres (a expectativa de vida das mulheres é de apenas 52 anos).
Nesse contexto, Nasro enfrenta diariamente dezenas de dificuldades para conseguir dar continuidade à sua educação: falta de comida, de água e de segurança; instabilidade da escola, com escassez de materiais e de professores; casos frequentes de estupro no caminho para o colégio; a normalização do casamento infantil, que para muitas ocorre por volta dos 13 anos; dentre diversos outros problemas.
Apesar disso, ela segue forte e determinada. E afirma “para quem já perdeu tudo, como eu perdi, a escola se torna tudo”.
O filme usa cenas ficcionais para representar eventos reais com certa dose de simbolismo e poesia, especialmente quando há violência. Utiliza as vozes dos atores Tessa Thompson e David Oyelowo e foi escrita pela poeta Warsan Shire, que, assim como a protagonista, também cresceu como refugiada.
Segunda chamada – diretora Joana Jabace
A série ficcional brasileira retrata a realidade das escolas noturnas de EJA (Educação de Jovens e Adultos). Em batalhas diárias, alunos e professores tentam não desistir, em meio à falta de estrutura e a péssimas condições materiais.
O programa encanta por suas histórias pessoais, que refletem tão bem a diversidade da população brasileira. Mostra a necessidade dos personagens resolverem seus conflitos e preconceitos para continuarem a conviver dentro daquele pequeno universo. O colégio Maria Carolina de Jesus engloba uma gama muito diversa de pessoas, de diferentes nacionalidades, religiões e profissões. Trabalha ainda questões importantes como a saúde mental dos professores e estudantes, as dificuldades de se estudar com um filho pequeno, a intolerância religiosa, dentre outros temas.
De acordo com a diretora, essa não é uma série sobre a instituição pública de ensino, e sim uma obra sobre relações humanas. É sobre superação, sobre pessoas que acreditam que é possível se transformar através da educação. Afinal, não são crianças e adolescentes que frequentam a escola por serem obrigados pelos pais. São adultos que, por motivos diversos, não puderam estudar antes e que agora optam por retomar/iniciar os estudos, mesmo enfrentando diversos empecilhos, como a exaustão após um dia de trabalho, a dificuldade de horários, a insegurança da região à noite, a exclusão por parte dos colegas e a falta de suporte por parte dos familiares e cônjuges.
Learning to skateboard in a warzone (if you’re a girl) – diretora Carol Dysinger
Esse documentário de 40 minutos mostra a realidade de muitas meninas no Cabul, privadas de educação – seja física ou acadêmica. Muitas vezes, as meninas são proibidas de praticar esportes e de frequentar as escolas por questões culturais, religiosas e/ou econômicas. Para combater essa situação, foi inaugurada em 2007 uma organização não lucrativa chamada Skateistan, que vincula a prática de skate com o ensino de matérias escolares em turmas apenas femininas.
As jovens são recrutadas em bairros carentes e a intenção é desenvolver nas meninas afegãs coragem, espírito de liderança, habilidades para trabalho em equipe, dentre outras características necessárias para combater os desafios do dia a dia. Além do esporte, a escola foca no ensino dos “Three R’s” (leitura, escrita e aritmética) e no convívio entre crianças diversas, expandindo sua visão de mundo e lhes ensinando sobre respeito em uma sociedade costumeiramente fechada e segmentada.
Learning to skateboard in a warzone (if you’re a girl) acompanha as alunas mais jovens da turma enquanto desenvolvem aptidões dentro e fora da pista de skate. De acordo com a diretora do filme, a intenção era realizar uma obra leve, que mostrasse a alegria e determinação dessas garotas. Afinal, segundo ela, estamos acostumados a ver sempre histórias trágicas quando se trata de mulheres no Afeganistão. “Esperamos” encontrar histórias de estupro, de gravidez precoce e de pobreza (que infelizmente acontece), quando há muito mais que que pode ser mostrado.
Este ano o filme está concorrendo tanto ao Oscar de Melhor Documentário em Curta-Metragem quanto ao BAFTA.
Lute como uma menina – diretores Beatriz Alonso e Flávio Colombini
Lute como uma menina é uma obra documental que retrata a ocupação de escolas de São Paulo, em 2015, como forma de protesto contra um projeto de reorganização da rede estadual de ensino, que previa o fechamento de diversas unidades e transferência de seus alunos à revelia.
Insatisfeitos, os estudantes se organizaram e ocuparam o Colégio Estadual de Diadema. O movimento foi se expandindo e inspirou a ocupação de mais de 200 escolas, tendo ampla repercussão na mídia.
Nesse contexto, os diretores Beatriz Alonso e Flávio Colombini, optaram por realizar um documentário focado no ponto de vista das garotas que participavam da ocupação. Com diversas entrevistas, as jovens falam sobre feminismo, liberdade, revolução e sobre o que se pode esperar da sua geração.
O espectador acompanha o movimento, que durou vários dias, incluindo o envolvimento da polícia, a resistência dos estudantes e o modelo educacional pensado pelos alunos para implementar nas escolas. Foram discutidas questões como limpeza, gestão, segurança, atividades culturais e participação ativa do corpo estudantil nas decisões relativas à escola.
É um filme sobre a luta por educação de qualidade, encabeçada por jovens e centrada na visão de meninas secundaristas, que refletem sobre seu país, sua educação e seu poder de transformação.