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O Brutalista | Teste Arte Aberta no Oscar 2025

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O filme O Brutalista com direção de Brady Corbet, foi indicado em 10 categorias no Oscar 2025, ficando atrás somente de Emilia Pérez que concorre em 13. As 10 categorias que ele foi indicado foram: Filme, Direção, Ator Principal (Adrien Brody), Ator Coadjuvante (Guy Pearce), Atriz Coadjuvante (Felicity Jones), Roteiro Original (Brady Corbet, Mona Fastvold), Trilha Sonora (Daniel Blumberg), Fotografia (Lol Crawley), Design de Produção (Judy Becker e Patricia Cuccia) e Montagem (Dávid Jancsó). 

O Brutalista recebeu o Globo de Ouro de 2024 na categoria Melhor Filme de Drama, Direção no BAFTA, Leão de Prata em Veneza, e até o momento foi indicado a 347 categorias, faturando prêmios em 121 delas.

O estilo brutalista é um movimento que surgiu em 1950 trazendo elementos crus, como concreto bruto, materiais de baixo custo, prezando pelo funcionalismo, devido ao período de escassez financeira e rápida necessidade de reconstrução no período pós-guerra. 

Há uma relação entre o pensamento de funcionalidade produtiva e a sociedade capitalista, na qual tudo é comprado e necessariamente precisa ter funcionalidade com intuito de transformação financeira, e, quando não acontece, perde a utilidade. Ao mesmo tempo, é preciso pensar que as bases da sociedade são construídas por figuras imigrantes e marginalizadas que são submetidas a situações de extremo abuso pela relação de poder com o dinheiro. Quem, então,  explora as mais diversas situações? Quem são aqueles marginalizados pelos marcadores sociais e empurrados para condições cada vez mais brutais, nas quais o concreto aparente não é apenas um conceito, mas um reflexo de como somos moldados pela funcionalidade? A identidade é homogeneizada para se encaixar na nova sociedade, apagando singularidades em nome da eficiência. E o que se pode exigir de beleza, criatividade e produtividade quando tudo é arrancado — origem, liberdade, perspectiva — e resta apenas a necessidade de sobreviver e se ajustar à luta contra a escassez? E quando se perde a utilidade, o que resta além do descarte e do apagamento?

O filme é uma coprodução internacional entre Estados Unidos, Reino Unido e Hungria. Um detalhe polêmico envolve o uso de inteligência artificial para acentuar o sotaque húngaro do casal de protagonistas, levantando questões sobre a padronização das identidades. Seria mais um exemplo da funcionalidade moldando não apenas aspectos econômicos e estéticos, mas também identitários, impondo uma homogeneização artificial?

Além disso, surge a questão: por que não escalar atores de origem húngara para os papéis? O protagonista é norte-americano, — pai judeu polonês e mãe de ascendência húngara católica e judaica —, enquanto sua coprotagonista, Felicity Jones, é britânica. 

A seguir, analisamos o filme pelo Teste Arte Aberta, conheça mais no nosso texto introdutório.

Sinopse

De acordo com a percepção do Arte Aberta evitando spoilers

O arquiteto húngaro László Tóth (Adrien Brody) parte para os Estados Unidos em busca do sonho americano, tentando escapar do cenário devastador do pós-Segunda Guerra Mundial, enquanto aguarda a chegada de sua esposa e sobrinha. O filme explora a dura realidade da desumanização dos imigrantes que lutam por condições dignas de sobrevivência, ao mesmo tempo em que enfrentam diversos tipos de abusos que violentam brutalmente sua humanidade e destroem sua identidade cultural.

Ótica de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD 

O filme apresenta poucas personagens femininas com participação significativa na trama: Erzsébet Tóth (Felicity Jones), Zsófia (Raffey Cassidy e Ariane Labed, que interpreta a personagem no epílogo, anos depois), Maggie Lee (Stacy Martin) e Audrey (Emma Laird). Todas são mulheres brancas.

Erzsébet, esposa de László, tem o maior destaque entre elas. Inicialmente, sua presença é sentida por meio das cartas enviadas ao marido, nas quais o mantém informado sobre os esforços para reunir a família nos Estados Unidos. Quando finalmente aparece na trama, Erzsébet revela-se uma mulher habilidosa na comunicação, com grande traquejo social e um papel crucial no desfecho da história. Sua trajetória, no entanto, é marcada por limitações físicas devido à osteoporose, que a obriga a usar cadeira de rodas, sendo caracterizada como pessoa com deficiência (PcD) ao longo da narrativa.

Zsófia, a sobrinha de László, surge como uma personagem silenciosa durante sua adolescência, sem se comunicar verbalmente até ser resgatada do ambiente abusivo dos patrões de seu tio e do contexto que estava inserida anteriormente. Seu arco culmina com a decisão de se mudar para Jerusalém, onde busca reconstruir sua vida e contribuir para o resgate da identidade judaica. O epílogo presta uma homenagem significativa a László, destacando o legado que ele deixou para a família.

As personagens Maggie e Audrey têm participações menores. Audrey aparece no início do filme como responsável, junto ao marido, pela expulsão de László de seu local de trabalho e moradia. Já Maggie, apesar de inserida em um contexto de desumanização, demonstra empatia e tenta auxiliar Erzsébet.

Sob a ótica de gênero, o filme evidencia a brutalidade social ao explorar marcadores de interseccionalidade e hierarquias de poder, que variam conforme fatores como gênero, etnia e classe. A narrativa sugere uma escala de opressão na qual homens brancos e ricos estão no topo, seguidos por homens judeus pobres, mulheres brancas e, por fim, homens negros pobres, e assim ausência de mulheres negras e outras representatações não-brancas. O sonho americano se revela quase inalcançável quando esses marcadores atravessam a vida dos personagens. Além disso, o filme aborda dinâmicas de poder e objetificação feminina, evidentes em algumas cenas.

Existem dois personagens de apoio negros que aparecem na trama, Gordon (Isaach De Bankolé) e seu filho William (interpretado por Zephan Hanson Amissah e Charlie Esoko, este último quando ainda criança). László os conhece em um momento de extrema vulnerabilidade, quando ambos buscam sobreviver em abrigos comunitários para pessoas em situação de rua e em ações de distribuição de alimentos. A partir desse encontro, nasce uma amizade entre László e Gordon, que se fortalece ao longo do tempo por meio dos laços criados mais fortemente pelo ambiente de trabalho. O filme retrata episódios de racismo direcionados a Gordon, momentos em que László se posiciona em defesa do amigo. No entanto, mesmo com essa aliança, a relação entre eles carrega uma sutil assimetria de poder. László, devido à sua posição social e papel central na trama, acaba assumindo, ainda que de forma não-violenta, uma postura de superioridade que reproduz padrões opressores, revelando como dinâmicas de desigualdade podem persistir mesmo em relações de amizade.

A relação entre Gordon e William é explorada de maneira breve, destacando a dificuldade do filho em expressar sentimentos diante de sua realidade. Esse aspecto evidencia um debate sobre a masculinidade, especialmente entre homens negros, que frequentemente enfrentam pressões sociais para suprimir emoções em prol de uma postura de resistência e força.

Embora a participação de Gordon e William seja pontual e não altere significativamente o rumo da história, suas presenças funcionam como importantes marcadores de interseccionalidade. Eles ilustram como os ciclos de submissão e desigualdade se perpetuam através de recortes sociais como classe, raça, gênero e, no contexto do filme, também origem/religião.

Cabe destacar que a história é contada sob a perspectiva de imigrantes brancos, que têm amplo destaque na narrativa. No entanto, por se tratar de uma questão étnico-religiosa, o filme não se enquadra nos critérios do Teste Arte Aberta, apesar de apresentar marcadores claros de repressão desse grupo no contexto dos Estados Unidos.

Não há representação LGBTQIAP+ explícita no filme, embora o enredo sugira, em alguns momentos, uma possível relação afetiva entre os primos. Além disso, certas críticas apontam a interpretação de um personagem como alguém que vive uma sexualidade reprimida. No entanto, essa não foi a leitura adotada pelo Coletivo, que compreende a narrativa como um retrato da desumanização resultante das relações de opressão estruturadas pelo sistema de utilidade produtiva. Nesse contexto, o valor do indivíduo está diretamente atrelado à sua capacidade de produzir, e o dinheiro se torna o instrumento que permite explorar talentos, corpos, vidas até não restar mais nada, como forma subjugando-os às vontades alheias.

Representatividade de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD

Direção e Roteiro*

* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero

A direção é de Brady Corbet e o roteiro é assinado por ele e por Mona Fastvold, que são casados desde 2012. Em 2020 ela dirigiu o filme Um Fascinante Novo Mundo.

Dessa forma, a ficha técnica principal (direção e roteiro) é composta 0 % por pessoas não brancas, 50% por mulheres, 0% PcD e 0% LGBTQIA+.

Elenco principal*

Créditos iniciais/finais

* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero

Nos créditos iniciais aparecem nove nomes, dentre eles, sete com maior destaque: Adrien Brody, Felicity Jones, Guy Pearce, Joe Alwyn, Raffey Cassidy, Stacy Martin, Emma Laird.  Os outros dois nomes que aparecem em seguida são: Isaach De Bankolé e Alessandro Nivola.
Assim, temos três mulheres brancas, um homem negro, e cinco homens brancos. Não encontramos nenhuma fala pública ou oficial sobre o elenco ser LGBTQIA+ e PcD.

Dessa forma, o elenco é composto por 22,2% de mulheres, 11,1% de não-brancos, 0% LGBTQIA+ e 0% de PcD.

Representação

Mulheres

Presença (Bechdel-Wallace)

As mulheres têm nome? 

Se falam por mais de 60 segundos?

Sobre outro assunto que não seja homens? 

Aprovado.

Há poucos diálogos das personagens femininas com nome dentro de um contexto de conversa entre si, mas há uma breve cena entre Zsófia, Erzsébet e seus respectivos companheiros quando é anunciado a partida para Jerusalém que ultrapassa 30 segundos. Maggie e Erzsébet também têm algumas trocas curtas. Cabe destacar que o filme fica no limiar da aprovação, pois estas personagens não estão conversando somente entre si, tanto que até o momento, o site The Brutalist – Bechdel Test Movie List colocou como reprovado. Todavia no Mediaversity Reviews indica que o filme passa com dificuldades.

Arco Dramático (Mako-Mori) 

Tem mulher? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de gênero?

Aprovado.

Erzsébet é retratada como uma mulher inteligente, com um arco dramático próprio, ainda que fortemente entrelaçado à história de László. Ela expressa suas opiniões de forma firme e demonstra autonomia em suas convicções. Apesar da presença de estereótipos de gênero em algumas cenas, especialmente aquelas que objetificam a mulher, a personagem ganha profundidade ao revelar seus pensamentos, desejos e personalidade. Em determinado momento, há uma quebra de expectativa quando o filme destaca o desejo sexual de Erzsébet de forma mais evidente do que o do protagonista masculino, adicionando uma camada interessante na desconstrução de estereótipos.

Zsófia, por sua vez, encontra sua voz quando é desvinculada ao ciclo de repressão, manifestando o desejo de reconstruir sua vida em um novo lar. Seu momento mais marcante ocorre no epílogo, quando faz um emocionante relato sobre o impacto e o legado deixado por seu tio. No entanto, seu papel permanece como apoio à trama principal, sem um arco dramático próprio. O filme também sugere que Zsófia foi vítima de violência sexual, mas esse aspecto não é explorado sob a perspectiva da personagem, limitando a abordagem do tema e focando apenas na brutalidade da opressão de poder, refletida na desumanização das mulheres.

Competência (Tauriel)

Houve mulher(es) com atividade profissional definida? 

Ela é competente na atividade?

Grau da Competência Caso a mulher seja competente, quão competentes elas são em sua atividade profissional (1 a 5 , sendo  1 – pouco competente e 5 – muito competente) 

Houve reconhecimento dessa competência?

Aprovado. 

Nota: 2

Erzsébet revela-se uma mulher habilidosa na comunicação, com formação elogiada. Sua competência é percebida no sentido de ser indicada a cargos de confiança em um jornal, ainda que a função que ela é alocada seja considerada menor do que sua competência, pois há de lembrar que ela é uma imigrante. Sua sobrinha reconhece sua competência, inclusive por considerar que, com as suas credenciais, ela poderia estar em uma posição melhor em outro ambiente. 

Qualidade da representação – mulheres

Como é a representação das personagens mulheres (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 2

As principais personagens femininas retratadas no filme são brancas. Embora haja maior participação de mulheres imigrantes, elas ocupam papéis secundários e, em alguns casos, são representadas por meio de estereótipos. Além de Erzsébet e Zsófia, Maggie e Audrey têm participações menores, mas ainda relevantes para a narrativa.

Audrey é uma norte-americana casada com o primo de László, que apresenta que ele se adaptou completamente aos padrões americanos para prosperar. Apesar de inicialmente demonstrar simpatia e gentileza, Audrey é colocada em uma situação desconfortável quando surge uma tensão sexual envolvendo o marido e László. Esse momento revela a fragilidade de sua posição, especialmente quando o próprio marido a utiliza como culpada pela decisão de expulsão de László, reforçando o estigma da culpa atribuída às mulheres.

Já Maggie é uma mulher branca e rica que, apesar de sua posição social privilegiada, demonstra empatia por Erzsébet. Sua solidariedade, mesmo em um contexto de desigualdade, adiciona complexidade à sua personagem, ainda que seu papel na trama seja de apoio.

Raça

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem não branco? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de raça?

Reprovado.

Apesar de acabarmos conhecendo um pouco da história de Gordon e William, um pai e um filho negros, não há desenvolvimento da trama para construção de arco dramático. 

Qualidade da representação – raça

Como é a representação dos personagens não brancos (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 2

Tanto Gordon quanto William não chegam a ter papel secundário, estão mais como papéis de apoio, ainda que na primeira parte do filme eles são apresentados de uma forma mais constante. Cabe ressaltar que tratam alguns aspectos vinculados a estereótipos uma vez que os únicos negros da trama estão vinculados a papéis de vunerabilidade social e sofrem racismo na trama, além de abordar a solidão do homem negro diante a dificuldade de se comunicar, atrelado principalmente a estereótipos de masculidade.

LGBTQIA+

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem LGBTQIA+? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de LGBTQIA+?

Reprovado. 

Não há representatividade LGBTQIAP+ explícita no filme.

Qualidade da representação – LGBTQIA+

Como é a representação das personagens LGBTQIA+ (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 0

Não há representatividade LGBTQIAP+ explícita no filme.

PcD 

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem PcD? Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de PcD?

Aprovado. 

Erzsébet, embora seja uma personagem secundária, possui uma trajetória própria marcada por limitações físicas decorrentes da osteoporose, que a obriga a utilizar cadeira de rodas, sendo caracterizada como pessoa com deficiência (PcD) ao longo da narrativa.

Inicialmente, há uma incerteza sobre a possibilidade de Zsófia também ser considerada PcD, já que, em grande parte das cenas, ela não utiliza a linguagem verbal. Contudo, ao longo da trama, fica evidente que seu silêncio é resultado do estado de choque causado pelas experiências traumáticas que viveu. Quando ela finalmente se desvincula do ciclo de repressão, passa a se comunicar verbalmente, o que afasta a classificação como PcD para fins desta análise.

Qualidade da representação – PcD

Como é a representação das personagens PcD (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 2

Erzsébet passa boa parte do filme utilizando cadeira de rodas, mas em uma cena crucial recorre a um andador, posicionando-se de forma segura e imponente diante de seus opressores. Não fica claro se essa escolha narrativa foi feita por razões estéticas — buscando simbolizar que ela enfrenta está enfrentando seus opressores— ou se além disso pode indicar um avanço em seu tratamento tendo maior mobilidade. No entanto, essa decisão pode ser interpretada como capacitismo, ao sugerir que ela precisaria abandonar a cadeira de rodas para transmitir força e autoridade, quando sua revelação poderia ter a mesma potência sem essa mudança.

Resumo do Teste Arte Aberta

Representatividade

Representação

Estrelas Arte Aberta: 2

Por Natália Brandino

Tem a mania de analisar, segmentar, e planejar. Mas também de conversar de séries e bobagens da vida. Não se engane com a seriedade aparente da capricorniana que sempre se esconde atrás de um livro.

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