Abrindo o Teste Arte Aberta, analisamos o filme Um Dia Com Jerusa, de 2020, dirigido por Viviane Ferreira, a segunda cineasta negra a dirigir solo um longa de ficção lançado comercialmente em salas de cinema no Brasil, disponível na plataforma Netflix. Antes dela, apenas Adélia Sampaio dirigiu o filme Amor Maldito (1984) e Glenda Nicácio juntamente com Ary Rosa Duarte dirigiram Café com canela (2018).
A história do filme Um Dia Com Jerusa nasceu do curta-metragem O Dia de Jerusa escrito e dirigido pela Viviane Ferreira, exibido na mostra curtas-metragens (Short Film Corner), do Festival de Cannes 2014.
Um Dia Com Jerusa foi premiado como Melhor filme no Gary Black Film Festival, CIndie Festival e Mostra de Cinema de Caruaru, exibido na Mostra de Cinema de Tiradentes, na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, na Blackstar Film Festival e indicado no AMAA – Africa Movie Academy Awards, na Nigéria.
Sinopse geral do filme
De acordo com a percepção do Arte Aberta evitando spoilers
Silvia, jovem negra lésbica, estudante de história e pesquisadora de mercado, acaba batendo à porta de Jerusa no dia do seu aniversário de 77 anos com o intuito de realizar uma pesquisa sobre sabão em pó. As duas navegam pela história de Jerusa, com memórias da ancestralidade, marcada pela família e a extensa relação com a fotografia.
A ótica de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD
O filme foca na vida de duas mulheres negras: Jerusa Anunciação, que tem uma forte relação com o passado, e Silvia Ferreira, que acaba tendo seu presente transformado pelas histórias de Jerusa.
Jerusa Anunciação é uma senhora negra, viúva, bastante comunicativa e curiosa que acompanha a rotina do bairro do Bixiga através da fotografia. Ao encontrar Silvia, Jerusa revisita o passado com memórias importantes da sua vida e da sua família relatando um passado cruel de escravidão e de mulheres lavadeiras, e dos homens presentes na sua vida.
Silvia Ferreira é uma mulher negra lésbica, estudante de história, pesquisadora de mercado, dedicada a passar em concurso público, e que está relutante em apresentar a namorada para a sua avó.
Identidade negra e sexualidade são os principais temas do filme conduzidos por Jerusa e Silvia. Os homens presentes na história aparecem através dos relatos da vida de Jerusa, como o seu pai apaixonado pela Vai-Vai e o seu marido “turco/sírio/libanês”, Raduan, que torrou o dinheiro dela no jogo, adiando os planos dela de aposentadoria.
Quando Jerusa caminha por seu bairro, ela passa por Sebastião (Antônio Pitanga), catador de papelão, por um homem em situação de rua que fica recitando versos, e por uma batida de policial nos meninos que brincavam na rua (todos negros).
Lourival, dono do bar, é bastante inconveniente com Silvia ao assediá-la enquanto ela realiza o seu trabalho de coletar dados. Silvia também esbarra em Sílvio, de origem oriental, o jornaleiro grita com Jerusa depois dela reclamar sobre o jornal ser do dia anterior.
Não há representação de PcD (Pessoa Com Deficiência) de forma clara.
Representatividade (gênero, raça e LGBTQIA+/PcD) na ficha técnica: Direção e Roteiro
Baseado no F-Rated
Direção e Roteiro são realizados por Viviane Ferreira, mulher negra, cineasta, ativista e advogada. Viviane é Mestra em Políticas de Comunicação e Cultura pela Universidade de Brasília. Presidiu a APAN (Associação de Profissionais do Audiovisual Negro), de 2016 a março de 2021. Fundou as plataformas Raio Agency e o streaming Todesplay e foi eleita Presidente do Comitê Brasileiro de Seleção do Oscar 2021.
Na nossa pesquisa, há menção sobre Viviane Ferreira como mulher lésbica integrando a comunidade LGBTQIA+. Não há menção sobre Viviane Ferreira ser PcD.
Vale ressaltar que além do roteiro e direção, há presença de outras mulheres negras: na fotografia (Lílis Soares), na direção de arte (Jamile Coelho) e na produção executiva (Viviane Ferreira e Bruna Anjos).
Representatividade (gênero, raça e LGBTQIA+/PcD) no elenco principal
Créditos iniciais/finais
No elenco principal os nomes de Léa Garcia (Jerusa), indicada ao prêmio de atuação feminina no Festival de Cannes em 1957, por Orfeu Negro (vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro) e Débora Marçal (Silvia), aparecem nos crédios inicias da obra, ambas mulheres negras. Na nossa pesquisa, não há menção sobre as atrizes pertencerem a comunidade LGBTQIA+ e PcD.
Nos créditos iniciais, também aparecem como Participação Especial Antônio Pitanga (Sebastião), Valdinéia Soriano (Vendedora – Foto Viva), Heliana Hemetério (apaixonada 2), Tássia Reis (Rosana), Valdecir Nascimento (professora da vídeo aula).
Análise da Representação das Mulheres
Bechdel-Wallace
As mulheres têm nome? Se falam por mais de 60 segundos sobre outro assunto que não seja homens?
Aprovado.
Passa com tranquilidade no Bechdel-Wallace. Jerusa e Silvia têm vários diálogos que refletem sobre o passado e as heranças de sua ancestralidade.
Mako-Mori
Tem mulher? Tem arco dramático próprio? O arco dramático é apoiado na narrativa do homem? O arco dramático é apoiado na narrativa de um par romântico?
Aprovado.
Jerusa e Silvia têm arcos dramáticos próprios que não são apoiados em homens.
Tauriel
Houve mulher(es) com atividade profissional definida? Quão competente são as mulheres em sua atividade profissional (1 a 5 , sendo 1 – muito incompetente e 5 – muito competente) Houve reconhecimento dessa competência?
Aprovado.
Silvia trabalha em uma empresa de pesquisa de mercado, estuda história, e é bastante dedicada em ingressar em um concurso público. Apesar de chegar atrasada para o treinamento de pesquisa de mercado, ela aparece entregando material de pesquisa ao Lourival e se dedica em retirar as respostas de Jerusa. No final, é recompensada com o preenchimento das perguntas por Jerusa. Além disso, Silvia é aprovada no concurso público ao qual tanto se dedicou, demonstrando-se competente.
Jerusa por sua vez, é uma fotógrafa com linhagem ampla de mulheres que também praticaram esse ofício.
Representação dos Personagens
Como é a representação dos personagens mulheres (escala de -1 a 3), sendo -1, estereótipos negativos; 0, Não tem; 1, personagem de apoio ou com estereótipos; 2, personagens secundário ou com poucos estereótipos; 3, muito bem representada e personagem principal sem estereótipos
3 – muito bem representada e personagem principal sem estereótipos
Silvia e Jerusa são personagens principais e não carregam estereótipos de gênero feminino. Ambas têm histórias próprias, diversas e são independentes.
Análise da Representação de Raça
Mako Mori
Tem personagem não-branco? Tem arco dramático próprio? O arco dramático é apoiado na narrativa de um par romântico?
Aprovado.
Jerusa e Silvia são mulheres negras que têm arcos dramáticos próprios que não são apoiados em seus pares românticos.
Representação dos Personagens
Como é a representação dos personagens não-brancos (escala de -1 a 3), sendo -1, estereótipos negativos; 0, Não tem; 1, personagem de apoio ou com estereótipos; 2, personagens secundário ou com poucos estereótipos; 3, muito bem representado e personagem principal sem estereótipos
3 – muito bem representado e personagem principal sem estereótipos
“Não há nada mais subversivo na história do Brasil do que ser mulher negra (…) disposta a sonhar é a expressão de desobediência civil inquestionável”, disse a professora (Valdecir Nascimento) no vídeo que Silvia estava assistindo para estudar. O filme foca nas personagens principais Silvia e Jerusa, duas mulheres negras muito bem representadas, além disso apresenta diversas representações de identidades negras e a história dos familiares de Jerusa e o passado vergonhoso de escravidão no Brasil.
Análise da Representação LGBTQIA+
Mako Mori
Tem personagem LGBTQIA+? Tem arco dramático próprio? O arco dramático é apoiado na narrativa de um par romântico?
Aprovado.
Silvia é uma mulher lésbica e a sua história não depende do seu par romântico. Além dela, aparece um casal de senhoras apaixonadas.
Representação dos Personagens
Como é a representação dos personagens LGBTQIA+ (escala de -1 a 3), sendo -1, estereótipos negativos; 0, Não tem; 1, personagem de apoio ou com estereótipos; 2, personagens secundário ou com poucos estereótipos; 3, muito bem representado e personagem principal sem estereótipos)
3 – muito bem representado e personagem principal sem estereótipos
Letícia e Silvia são um casal de mulheres. Letícia insiste para que Silvia conte da história delas para a avó de Silvia, que tem resistência até conhecer Jerusa.
Silvia é uma mulher LGBTQIA+, com sua própria história e sem estereótipos.
Análise da Representação PcD (Pessoa Com Deficiência)
Mako-Mori – Tem personagem PcD? Tem arco dramático próprio? O arco dramático é apoiado na narrativa de um par romântico?
Reprovado.
Não há representação de PcD (Pessoa Com Deficiência) de forma clara.
Representação dos Personagens
Como é a representação dos personagens PcD (escala de -1 a 3), sendo -1, estereótipos negativos; 0, Não tem; 1, personagem de apoio ou com estereótipos; 2, personagens secundário ou com poucos estereótipos; 3, muito bem representado e personagem principal sem estereótipos)
0 – Não tem.
Resumo do Teste Arte Aberta
Representatividade
Representatividade (gênero, raça e LGBTQIA+/PcD) na ficha técnica: Direção e Roteiro
| Mulheres | 100% |
| Negros | 100% |
| LGBTQIA+ | 100% |
| PcD | 0% |
Representatividade no Elenco Principal (atores e atrizes)
| Mulheres | 100% |
| Negros | 100% |
| LGBTQIA+ | 0% |
| PcD | 0% |
Representação
| Bechdel-Wallace – Mulher | Aprovado |
| Tauriel – Mulher | Aprovado |
| Mako-Mori – Mulher | Aprovado |
| Mako-Mori – Raça | Aprovado |
| Mako-Mori – LGBTQIA+ | Aprovado |
| Mako-Mori – Pessoas com Deficiência (PCD) | Reprovado |
Diversidade das personagens
| Mulheres | 3 |
| Raça | 3 |
| LGBTQIA+ | 3 |
| PcD | 0 |
| Estrelas Arte Aberta | 3 |
Uma resposta em “Teste Arte Aberta: Um Dia Com Jerusa”
[…] lançado comercialmente em salas de cinema e com protagonistmo negro, feminino e lésbico. O filme passou bem no nosso Teste Arte Aberta, recebendo três estrelas por sua pontuação na representação das […]