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4 obras audiovisuais pela luta antimanicomial

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Novela Lado a lado

Em 18 de maio é comemorado o Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Ele é parte do Movimento da Reforma Psiquiátrica iniciado na década de 70 para defender tratamentos respeitosos e dignos para todos. A partir do lema “por uma sociedade sem manicômios”, diversos segmentos da sociedade se uniram para denunciar abusos e violações de direitos humanos praticados dentro dessas instituições. E para propor uma reorganização dos modelos de atendimento, incentivando tratamentos dignos, inclusivos, que combatam o estigma e a segregação.

Em 2001, foi aprovada a Lei Paulo Delgado, que dentre outras coisas estabelece a proibição de hospícios. Na prática, no entanto, ainda existem diversas instituições similares, camufladas com outros nomes, mas que funcionam como espaços de segregação, isolando os pacientes com transtornos psiquiátricos do convívio em sociedade e aprisionando-os de forma compulsória.

Pensando na importância de difundir informação para não repetir erros e para gerar reflexões e mudanças nos dias atuais, o Arte Aberta listou algumas obras audiovisuais que trabalham a temática da luta antimanicomial.

Novela Lado a lado

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A novela Lado a lado, exibida na Globo de 2012 a 2013, contou a história de duas protagonistas. Uma delas era Laura, jovem de família aristocrata, frequentadora da alta sociedade, mas cuja família secretamente estava falida. Com a intenção de recuperar o patrimônio perdido, sua mãe arranja um casamento forçado entre a filha e um jovem de família rica. Relutante, sem estar apaixonada, mal conhecendo o noivo e com receio de perder sua independência, Laura é obrigada a se casar com Edgar.

Apesar do casal de fato se apaixonar, em determinado momento ela descobre que o marido teve um filho fora do casamento e se separa dele, o que gera um grande escândalo na sociedade da época. Além de separada, Laura decide trabalhar. Ela é professora e escreve para um jornal local, sob um pseudônimo, uma vez que jornalistas mulheres não eram aceitas na época. Estigmatizada, Laura é excluída e maltratada pela sociedade. Para evitar mais escândalos, sua mãe a interna em um manicômio, sob a justificativa de que uma mulher divorciada e que quer trabalhar só pode ser louca.

No manicômio, ela é torturada por meses, até ir aos poucos perdendo sua personalidade e a capacidade de reagir. Assim como ela, estão aprisionadas lá diversas mulheres saudáveis acusadas de não obedecer às expectativas que a sociedade estabeleceu para elas. Mulheres lésbicas, mulheres que não queriam se casar, que não queriam ter filhos, que transaram antes do casamento, que desagradaram seus maridos, que quiseram trabalhar ou exercer alguma atividade não permitida para mulheres na época. Qualquer uma que tivesse um comportamento que desviava do padrão era internada e esquecida lá dentro, apagada para sempre para não incomodar a sociedade.

A internação da personagem Laura foi inspirada em casos reais. 

Era uma prática comum no século XIX, que perdurou até meados do século XX. Na pesquisa de Luciane Reis (historiadora da novela), os prontuários dos médicos eram impressionantes. As justificativas para a internação parecem inverossímeis aos olhos de hoje. ‘A paciente apresenta grave obsessão por livros’, ‘desprezo pela família’, ‘excitação sexual nervosa’, ‘recusa em ter filhos’. Um dado notável é que boa parte das pacientes nos sanatórios eram mulheres que haviam estudado além do estipulado para as mocinhas na época, que só aprendiam o suficiente para ler, escrever e fazer contas. Elas foram além, fizeram o curso normal ou ainda eram normalistas, dedicavam-se ou não ao magistério, mas eram mulheres com o intelectual acentuado, com interesses sociais e profissionais, que fugiam à ideia do casamento e da maternidade como o único destino possível. Foram tantas mulheres que passaram por isso, a maioria anônimas, que os seus nomes só chegaram a nós por meio de suas tristes histórias, já que todo o impulso delas de independência foi sufocado pelos familiares, o pai ou o irmão, ou pelo marido, que tinham a autorização para interná-las mesmo contra a vontade. Quer dizer, eles tinham o poder de julgar e decidir se suas esposas, irmãs e filhas eram loucas ou não, e interná-las caso assim desejassem. Do mesmo modo, só eles, ou uma junta médica, podia tirá-las do sanatório, ou deixá-las para sempre lá, como foi o caso de muitas”.

Em 2013, Lado a lado ganhou o Emmy Internacional de melhor novela. A obra está disponível na GloboPlay.

Filme Nise: o coração da loucura (direção de Roberto Berliner)

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O longa-metragem de 2016 conta um pouco da história da psiquiatra brasileira Nise da Silveira, que revolucionou a saúde mental no país. Ela era contrária às técnicas psiquiátricas que envolviam choque e violência, tão comuns no período em que atuou como médica. Ferrenha defensora de tratamentos inclusivos e respeitosos, ela gerava incômodo nos demais profissionais e foi excluída de diversas esferas de trabalho.

Alocada no setor de terapia ocupacional enquanto trabalhou no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro, Nise desenvolveu atividades artísticas com os pacientes, estimulando sua criatividade e trabalhando a partir das obras, que comunicavam como cada um deles via o mundo e como se expressava.

Nise foi também pioneira na aplicação da psicologia junguiana no Brasil e no uso de animais como parte dos tratamentos (ela os chamava de co-terapeutas).

No filme, Nise da Silveira é interpretada por Glória Pires, que recebeu o prêmio de melhor atriz, em 2015, no Festival Internacional de Cinema de Tóquio (no qual o filme também foi premiado). A obra de Berliner venceu também o Festival do Rio e o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro (prêmio para Flavio Bauraqui, como ator coadjuvante).

Filme Bicho de sete cabeças (direção de Laís Bodanzky)

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O filme de 2001 aborda o processo de internação do protagonista Neto em um manicômio. Em uma relação conturbada com o pai, a situação em casa está insustentável e, a partir da descoberta de que o filho fuma maconha, Wilson decide internar o adolescente.

Lá, Neto é torturado, aprisionado em solitária, drogado frequentemente para perder a autonomia e a consciência. E em condições desumanas ele passa anos encarcerado, em um sistema até então legalizado e naturalizado.

A obra foi baseada no livro “Canto dos malditos”, relato autobiográfico de Austregésilo Carraro Bueno, internado à força pelos pais por três anos em um hospício. Inspirado em seus depoimentos, o filme denuncia as internações sem critério, a corrupção na gestão das instituições, o tratamento cruel e os traumas e sequelas (muitas vezes irreversíveis) gerados em pacientes que entraram saudáveis.

Seriado As telefonistas

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A série espanhola começa com quatro protagonistas, mas aos poucos vai incluindo no círculo principal um novo personagem. Apresentado inicialmente como Sara, supervisora das demais protagonistas na empresa de telefonia, o personagem em determinado momento revela que é um homem trans e assume o nome e a identidade de Oscar.

Confuso, tentando entender o que está acontecendo, ele procura médicos e relata como se sente. Convencido de que está doente e que precisa de tratamento, Oscar se interna em um hospital sob falsas promessas e depois descobre que na verdade se trata de um aprisionamento brutal e violento. Proibido de sair do manicômio, ele é mantido em isolamento e torturado e precisa contar com a ajuda das amigas para fugir.

A série está disponível na Netflix e conta com cinco temporadas.

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

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