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O clube das babás: união entre meninas e seus desenvolvimentos pessoais

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O clube das babás: união entre meninas e seus desenvolvimentos pessoais

É sempre maravilhoso encontrar uma obra infanto-juvenil que os adultos possam aproveitar tanto quanto as crianças! Isso ocorre com O clube das babás, seriado que estreou este ano no catálogo da Netflix e que foi baseado em uma série de livros.

O fenômeno surgiu com o romance Ginnie’s baby-sitting business, cuja popularidade fez com que a editora Scholastic investisse em uma série de, inicialmente, quatro livros, todos escritos por Ann M. Martin e intitulados The baby-sitters club. Neles, as personagens foram apresentadas e sua proposta de negócios – uma empresa de babás – começou a se consolidar. O sucesso foi tanto que a série teve ao todo 213 livros, publicados entre 1986 e 2000.

Em 1990, a história foi adaptada para série de tv e contou com 13 episódios. Em 1995, foi a vez de se tornar longa-metragem, com roteiro de Dalene Young e direção de
Melanie Mayron (que também é atriz, quem lembra dela como professora/mentora de escrita da protagonista na série Jane, the virgin?).

Dez anos depois da primeira série, a história foi adaptada novamente e conta agora com 10 episódios de vinte e poucos minutos cada. As personagens (com exceção de duas babás juniores) e a história central foram mantidas e giram em torno da criação de uma agência de babás. A peculiaridade é que todas as funcionárias da agência são pré-adolescentes. 

A ideia surge quando a personagem Kristy Thomas percebe a dificuldade de sua mãe para conseguir uma babá para ficar com o filho mais novo. Ela então decide que tem as habilidades necessárias para ajudar as mães em necessidade e juntar um dinheiro ao mesmo tempo. Ela convida sua melhor amiga Mary Anne para essa empreitada e também uma antiga amiga de quem havia se afastado com o tempo, Claudia. Essa última traz para a equipe a recém chegada à cidade, Stacey, que está se esforçando para fazer novos amigos. Após um tempo, a agência recebe mais uma integrante, Dawn, que se muda para Stoneybrook com a mãe em meados do ano escolar.

Um dos pontos altos da série é a diversidade das protagonistas. Cada episódio é contado pelo ponto de vista de uma delas, o que permite ao espectador conhecer um pouco mais sobre cada núcleo familiar e sobre os desafios e habilidades de cada uma das meninas. É interessante ir se identificando com uma ou com outra (ou um pouquinho com todas) e aprendendo a gostar delas justamente por suas histórias únicas.

As protagonistas estão em uma fase de transição entre a infância e a adolescência e estão descobrindo do que gostam, o que querem realizar, como querem ser vistas e quais são suas prioridades. Esse processo da auto descoberta, da amizade e do companheirismo entre elas são os principais eixos do programa. É animador acompanhar essa relação que se fortalece e que proporciona tantos momentos gostosos de amigas que se divertem e aprendem juntas (naturalmente existem desentendimentos, mas são todos trabalhados e solucionados com compreensão e gentileza).

Kristy

Kristy é bem ativa, autoritária e centralizadora, a típica chefe do grupo. Ela encara a agência de babás de forma séria e bem profissional. Prática e boa em tomar decisões, ela não reage bem ao ser contrariada. Isso às vezes gera um clima difícil para o grupo e é algo que ela precisa trabalhar ao longo da série para manter suas amizades.

Kristy não tem contato com o pai e sofre com essa ausência (o que é trabalhado de forma extensa no filme de 1995, mas que é apenas mencionado na série de 2020). Sua mãe tem um novo namorado e está prestes a se casar, o que desperta diversos sentimentos negativos na menina. De repente ela tem um padrasto, irmãos, uma nova casa, um novo padrão de vida e toda a sua rotina gira em torno do casamento da mãe. Ela não está nada animada com toda essa mudança que foge do seu controle. Apesar de compreender que é um momento delicado e que merece atenção, Kristy protagoniza algumas cenas de mal comportamento em relação ao padrasto que chamam atenção de forma negativa. Ao assistir com crianças, pode ser interessante conversar a respeito.

Mary Anne

A melhor amiga e vizinha de Kristy chama-se Mary Anne. Ela é uma jovem tímida e que tem dificuldade para se posicionar perante os demais. Órfã de mãe, ela é superprotegida pelo pai e vive em meio a diversas regras rigorosas que são diferentes das realidades de suas amigas. Infantilizada pelo pai, e sem saber como dizer isso a ele, ela usa um corte de cabelo e roupas que não gosta e sonha em mudar a decoração de seu quarto para algo mais adequado para a sua idade. Ela tem vergonha de conversar com desconhecidos e de chamar atenção e aos poucos vai trabalhando essas dificuldades em seus trabalhos como babá e na relação com as amigas.

Mary Anne inicialmente pode passar uma imagem de fragilidade, mas com o tempo vai revelando uma força incrível. Quando precisa lidar com crises, ela é uma rocha, não deixa de falar o que precisa ser dito e faz questão de defender o que acredita, sem se intimidar ao falar com adultos.

Um episódio em particular é genial em mostrar essa faceta que nem a própria Mary Anne conhecia. Ao ser babá de uma criança através da agência, ela precisa ir ao hospital e garantir um cuidado respeitoso para sua “cliente”. No trabalho, ela tem contato com uma menina trans pela primeira vez. Com muita naturalidade, ela vai atrás de se informar sobre o tema e ao final do episódio protagoniza uma bela fala frente a adultos que insistem em se referir à menina como menino. Sem medo, sem timidez, ela percebe que aquilo precisa ser dito e dá uma lição aos funcionários do hospital, com educação, com calma e de forma certeira. Essa é Mary Anne! Tímida, aparentemente passiva, mas extremamente forte e aprendendo a encontrar essa firmeza.

Claudia

Claudia é uma jovem estilosa, talentosa e que ama pintar. Ela monta looks modernos e ousados e é considerada uma inspiração para as amigas no modo de se vestir e se comportar. Ela vem de uma família de origem nipônica e vive com os pais, a irmã e a avó Mimi. Com essa última ela tem uma relação especial, repleta de amor e companheirismo. É a pessoa da família que ela considera que mais a compreende e que a aceita como ela é. Por esse motivo, quando a avó tem um problema de saúde, ela precisa do carinho e do apoio das amigas. É uma boa oportunidade para trabalhar com crianças esses sentimentos de perda, medo da morte, problemas de saúde de entes queridos e medo de hospital. Afinal, são temas necessários e inevitáveis e a série trabalha com eles de forma sensível.

Esse episódio faz também com que Claudia se interesse mais pelo passado de Mimi. Ela percebe que, apesar da avó ser o membro da família que mais a compreende, ela própria nunca se interessou muito por conhecer a avó. Ou pelo menos por conhecer outros lados dela, para além de avó. Parte então em uma jornada para compreender a história de sua melhor amiga.

Stacey

Stacey é recém chegada na pequena cidade de Stoneybrook. Ela veio com os pais de Nova York e por isso é vista pelas meninas como cosmopolita e cheia de referências de uma cidade e um mundo que elas ainda não conhecem. Ela representa os receios de alguém que chega em um lugar novo, ainda sem amigos, tentando se encaixar e temendo ficar isolada. Mas com a ajuda das babás, ela logo passa a se sentir acolhida e a sentir que faz parte de um grupo. 

Inicialmente sem saber em quem pode confiar, Stacey guarda um segredo, que depois descobrimos tratar-se de um problema de saúde. As amigas são parte importante para que ela se sinta confortável e bem com sua condição. É um bom gancho para conversar com crianças sobre algumas doenças e para acabar com tabus que as cercam.

Dawn

Por último, a agência conta com os serviços de Dawn, que chegou na cidade com o ano escolar já iniciado. Bastante sociável, ela não tem dificuldade em se aproximar das meninas e logo pede para fazer parte do seleto grupo de babás. Ela tem um lado político bem aflorado e defende fervorosamente as causas em que acredita, incitando greves e pequenas revoluções. No filme de 1995 esse seu engajamento era especificamente voltado para a defesa do meio ambiente, mas em 2020 é também centrado na defesa dos direitos humanos e na igualdade de condições para todas as crianças.

O clube das babás: a força de um grupo de amigas

No filme de 1995, Mary Anne namorava, Dawn tinha um pretendente e Stacey viveu um romance de verão. Na série de 2020 nenhuma delas namora. Mas diferente das outras babás (que se limitam a achar algum colega bonito e ficar ansiosas ou constrangidas ao encontrá-lo na escola), Stacey tem de forma marcante a vontade de viver um romance. Em seu eixo narrativo existe uma camada maior de romantização, com paqueras e tentativas (na maioria frustradas) de chamar atenção de meninos. Inclusive com a priorização dessas paqueras em detrimento da amizade (o que posteriormente é questionado e desenvolvido na narrativa). Apesar de sentir que o roteiro às vezes pesa a mão nessa questão, esse definitivamente não é o foco da série e não inviabiliza todas as inúmeras qualidades da história.

Com perfis diferentes e complementares, é fácil reconhecer nas protagonistas diversas pessoas que conhecemos. É inspirador vê-las superando os desafios e, especialmente, passando por isso juntas. Aprendendo a força que um grupo de amigas pode ter, descobrindo que podem sempre aprender umas com as outras e se orgulhando das amigas a cada nova conquista. 
O clube das babás retrata o poder da união entre meninas ao mesmo tempo em que mostra seus processos individuais de crescimento. Ao longo do caminho aborda questões importantes como saúde, luto, adaptação para novas estruturas familiares, aceitação de mudanças, descoberta de aptidões e talentos, amadurecimento, busca pela história familiar, primeira menstruação, dentre muitos outros temas.

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

Uma resposta em “O clube das babás: união entre meninas e seus desenvolvimentos pessoais”

Ótima matéria! acabei de terminar a terceira temporada dessa série e estava procurando alguém que reconhecesse e falasse um pouco sobre a qualidade dela, nunca pensei me identificar tanto com uma série infantil sobre babás (particularmente com a Kristy e a Claudia) e menos ainda que a tal série me fizesse chorar, como foi o caso do último episódio.

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