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Carta para Liniker | Intimidade | Cartas Para Elas

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Querida Liniker,

Liniker no videoclipe Intimidade

Temos passado por tempos estranhos, para dizer o mínimo. Muitas vezes, me pergunto: onde estava escondido tanto ódio para emergir assim de tantos lugares e chegar ao topo do nosso governo? Tanta loucura, tanta estupidez. E imagino também que na sua história nem tudo foram flores. Mas hoje a sua força – que explode no amor e na delicadeza – me faz ter um respiro. Você é respiro em terra de intolerantes. Você é possibilidade. É flor que nasce do asfalto, entre pequenas rachaduras, e nos leva junto para encontrar o sol. Com Goela Abaixo, seu mais novo álbum, isso tudo aparece. Ainda mais na música Goela, com um coro de mulheres “lutando”, gritando, exigindo carinho. 

Mas, Liniker, queria falar do clipe Intimidade. Intimidade que pode ser entendida para além da opressão, como um campo de negociações transacionais (1). Intimidade que “finca afeto no nosso peito” e que afirma que “carinho não pode fazer doer”. Afeto permitido. 

Numa relação entre interno – com cenas num quarto – e externo – que aparece pelas janelas ou quando você sai nas ruas, a intimidade está ali, na madrugada, protegida dos olhares dos outros, amparada apenas por quem se ama. 

De dentro do quarto – cenas filmadas dentro do emblemático prédio Copan, projetado por Oscar Niemeyer -, vemos janelas, que nos lembram que há um mundo lá fora, mas quem se importa? Ou caminhamos com você por uma São Paulo de ruas vazias, mas provando que há amor por lá sim – e por todo lugar do nosso país, nos cantos, escondido; mas você mostra, em gestos gentis, em gestos sutis, no toque na ponta do nariz, num olhar que sorri. “Num olhar que mergulha”. 

As cenas internas se passam em um quarto, na casa – o espaço de intimidade por excelência. E nessa revolução do amor, você e Linn transformam o espaço, fazem dele o lugar de vocês, criam o seu “canto no mundo” (2).

Hoje, ainda mais, colocar em relevo o cotidiano e a intimidade, em uma sociedade imersa na explosão informacional e imagética, é uma opção ética (3).  Porque, como disse lá no comecinho, você traz possibilidades – de ser quem se é, de amar quem quiser e de dar o seu recado com leveza. Uma afronta aos que acham que podem tutelar nossos corpos e nossos sentimentos. Tolos. 

Do lado estético, é nos close-ups (4) que nos sentimos tão íntimas dessas personagens, que entendemos a sua relação e que coletamos sugestões sobre seus sentimentos. Chegamos perto e podemos ver o piano tocado nas costas uma da outra, o corpo molhado no banho, a boca que canta poesia.

Música, palavras, espaço e estética, tudo combinado para tornar político o que é íntimo. Tudo entrelaçado para simplesmente ser o que é. Tudo lindo. Tudo possível. E quem assiste, agradece.

Referências

GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor & erotismo nas sociedades modernas. São Paulo, SP: Editora UNESP, 1993.

BACHELARD, Gaston. “A poética do espaço”. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

LOPES, Denilson. A Delicadeza: Estetica, Experiencia e Paisagens. Brasília: EdUnB, 2007.  BACHELARD, Gaston. “A poética do espaço”. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

LINDSAY, Vachel. Congo Negro (Trad. Luci Collin). Porto Alegre: Editora Éblis, 2009.

Créditos – videoclipe Intimidade

Cantora: Liniker de Barros Ferreira Campos 

Participação Especial: Linn da Quebrada 

Direção e Edição: Sabrina Duarte 

Diretor de Fotografia: Milena Seta 

Coordenação de produção: Leila Penteado 

Produção Executiva: Tarcilla Villa 

Diretor de Produção: Bernie Walbenny 

Produtora: Izabela Ribeiro 

Por Lina Távora

É uma cearense que mora em Brasília, jornalista fora da redação, mestre em comunicação/cinema, feminista em construção, mãe com todo o coração e tem no audiovisual uma paixão constante e uma fé no seu impacto para uma mudança positiva na sociedade.

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