Categorias
Pesquisa

Em 23 anos, apenas um filme brasiliense foi dirigido por mulher

Compartilhe!

Nos 23 anos analisados pela pesquisa Cinema Brasiliense: gênero e representação, apenas um filme foi dirigido por uma mulher: Um assalto de fé, de Cibele Amaral. A pesquisa analisou 20 longas-metragens de ficção realizados por produtoras ou coprodutoras do Distrito Federal, lançados comercialmente em salas de cinema, de 1995 a 2018. Nos filmes, não há representatividade de pessoas não binárias, amarelas e/ou indígenas, nem de mulheres negras na direção e no roteiro. 

Lu Teixeira, em Até que a Casa Caia, é a única mulher que ocupa a função de roteirista sozinha, as demais roteiristas dividem a função com homens. A direção de arte é a função com maior representatividade feminina (50%) e a produção executiva é a segunda (47%). Carina Bini, do filme “O Colar De Coralina”, é a única mulher na produção executiva classificada como negra (parda).

Na análise do elenco principal, dos 20 filmes analisados, 41% dos atores são mulheres e 59% homens. Em relação à raça, 76% são brancos e 24% negros (5% pardos, 19% pretos). Não houve representatividade de pessoas não binárias, amarelas e/ou indígenas no elenco principal. 

Apenas 25% dos filmes analisados apresentam o protagonista central como um homem negro (preto ou pardo). Em relação às mulheres, 15% apresentam uma mulher branca como personagem central, e apenas 5% exibem o protagonismo central de uma mulher negra. E mais:  em 45% das obras a representação de mulheres é atrelada a questões sexuais, à sexualização e à violência/assédio sexual – atuando como prostitutas ou sofrendo violências sexuais. Apenas 25% têm personagens queer (LGBTQIA+). 

O filme O Colar de Coralina tem 100% do elenco principal composto por mulheres. As Vidas de Maria traz uma narrativa voltada para uma protagonista mulher de forma quase exclusiva, e Uma Loucura de Mulher também traz destaque feminino. Filhas do Vento centra a narrativa em mulheres negras. Branco Sai Preto Fica foi o filme com maior representação negra no elenco (com 100% de profissionais pretos).

Análise

Para identificação da ficha técnica principal foram utilizadas as funções descritas pela ANCINE nos relatórios de participação feminina na produção audiovisual brasileira (2015, 2016, 2017 e 2018): direção, roteiro, produção executiva, direção de fotografia e direção de arte.

Foi utilizada a definição de elenco principal como sendo aquelas pessoas colocadas em destaque nos créditos iniciais ou finais de cada obra, não sendo consideradas parte do elenco principal as atrizes e os atores determinados como participação especial. A pesquisa utilizou a metodologia de heteroidentificação pela classificação por terceiros e, quando havia dados disponíveis, a autodeclaração por meio de entrevistas, depoimentos e outros documentos. Cada profissional foi analisado por um pesquisador e revisado por dois avaliadores diferentes, nos casos em que havia dúvida. Os casos em que se manteve a divergência foram levados a um grupo formado por seis pesquisadores, para deliberação final.

Para classificação de gênero, foram utilizadas as categorias do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, utilizando o nome presente nos créditos dos filmes e fotografias públicas do profissional. 

Na identificação, foi atribuído o gênero feminino para mulheres (cis e transexuais), e gênero masculino para homens (cis e trans). Foi acrescida a categoria “não binária” nos casos que havia a possibilidade de classificação de autodeclaração, nos dados disponíveis em entrevistas, depoimentos e outros documentos. Tendo em vista as limitações da metodologia de heteroidentificação não foi possível ampliar o escopo para distinção entre cis e trans, tendo em vista a complexidade da questão.

Para raça, foram também utilizadas categorias do IBGE (branca, negra – preta e parda, indígena e amarela) a partir dos nomes nos créditos dos filmes e de fotografias públicas. Nas análises, optou-se por fazer uma indicação individualizada de pardos e pretos. Para a classificação de pessoas negras, foi somada a população preta à população parda – conforme a classificação do IBGE. Tendo em vista que o método escolhido é baseado em fotografias e imagens disponíveis, pode haver distorções devido ao impacto de iluminação, maquiagem, modificações em fotos, caracterização de personagens. Nos casos que a autodeclaração de raça estava disponível no material analisado, esta foi usada. 

Vale também destacar que por se tratarem de obras de um período de 23 anos, as representações podem refletir os discursos e realidades da época em que foram realizadas e não necessariamente estão relacionadas ao que autor/diretor da obra pensam atualmente.

Os filmes analisados

Entre 1995 e 2018, foram realizados 20 longas de ficção, excluindo o estilo experimental, por produtoras ou coprodutoras do DF. Esse é o recorte da pesquisa. Vale ressaltar que nos 23 anos analisados, entre os 20 filmes brasilienses lançados em salas de cinema, apenas um foi dirigido por uma mulher: Um assalto de fé, de Cibele Amaral.

Os filmes em análise são:

Ano de LançamentoTítuloDireção
1995Louco por CinemaAndré Luiz Oliveira
1999No Coração dos DeusesGeraldo Moraes
2005As Vidas de MariaRenato Barbieri
2005Filhas do VentoJoel Zito Araújo
2006A Conspiração do SilêncioRonaldo Duque
2009Se Nada Mais Der CertoJosé Eduardo Belmonte
2010FederalErik de Castro
2011Simples MortaisMauro Giuntini
2011Um Assalto de FéCibele Amaral
2013A Última EstaçãoMárcio Curi
2013CruJimi Figueiredo
2013Nove Crônicas para um Coração Aos BerrosGustavo Galvão
2014Uma Dose Violenta de Qualquer CoisaGustavo Galvão
2015Até que a Casa CaiaMauro Giuntini
2015Branco Sai Preto FicaAdirley Queirós
2015O Último Cine Drive-InIberê Carvalho
2016O Outro Lado do ParaísoAndré Ristum
2016Uma Loucura de MulherMarcus Ligocki Júnior
2018A Repartição Do TempoSantiago Dellape
2018O Colar De CoralinaReginaldo Gontijo

Informações da Pesquisa

Pesquisa Cinema Brasiliense: gênero e representação

O estudo foi contemplado no Edital do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) Audiovisual – n° 16/2018, da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Governo do Distrito Federal.

Natália Brandino é a idealizadora do projeto. Ela é membro do Coletivo Arte Aberta e da Kocria Audiovisual.

Portal: www.representacaonoaudiovisual.com

E-mail: representacaonoaudiovisual@gmail.com

Por Natália Brandino

Tem a mania de analisar, segmentar, e planejar. Mas também de conversar de séries e bobagens da vida. Não se engane com a seriedade aparente da capricorniana que sempre se esconde atrás de um livro.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *