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Os rejeitados | Teste Arte Aberta no Oscar 2024

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O filme Os rejeitados foi indicado em cinco categorias no Oscar 2024: Filme, Roteiro Original (David Hemingson), Ator Principal (Paul Giamatti), Atriz Coadjuvante (Da’Vine Joy Randolph) e Montagem (Kevin Tent).

O filme estreou no 50º Festival de Cinema de Toronto do ano passado e chegou aos cinemas brasileiros em janeiro de 2024. A obra teve indicações em diversos outros festivais, tendo vencido o Globo de Ouro de Atriz Coadjuvante e de Ator Principal em filme de comédia ou musical; e o Critics Choice Awards nas categorias de Atriz Coadjuvante, Ator e Ator/Atriz jovem.A seguir, analisamos o filme Os rejeitados com o nosso Teste Arte Aberta. Para saber mais sobre o teste, confira o texto introdutório.

Sinopse

De acordo com a percepção do Arte Aberta evitando spoilers

Quando chegam as férias de final de ano, quase todos os moradores de um prestigiado colégio interno se preparam para ir embora. Menos um grupo de cinco alunos, que por motivos diversos terá que passar o feriado na escola, longe de suas famílias. Eles têm como companhia apenas um professor rabugento, que foi obrigado a cuidar deles e que encara a tarefa com cinismo e muitas reclamações, e uma funcionária que busca reclusão durante seu processo de luto. 

elenco principal de Os rejeitados

Ótica de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD 

O filme Os rejeitados foca especialmente na relação entre o estudante Angus Tully (Dominic Sessa) e o professor Paul Hunham (Paul Giamatti), dois homens cis brancos e héteros.

Na escola não tem professoras. Apesar disso não ser dito expressamente, no início do filme vemos a mesa do corpo docente e só são mostrados profissionais homens. Junto com o diretor e a massa de estudantes, esse é um espaço majoritariamente masculino. No entanto, no período das férias, as figuras que se destacam ao redor dos protagonistas são duas mulheres, Mary Lamb (Da’Vine Joy Randolph) e Lydia Crane (Carrie Preston), responsáveis por conferir acolhimento e gentileza para equilibrar a relação conflituosa entre Angus e Paul.

Danny (Naheem Garcia) é zelador do colégio e, junto com Paul e Mary, também está trabalhando durante as férias escolares. Ele tem bem menos espaço na narrativa do que os demais. Junto com o estudante Ye-Joon Park (Jim Kaplan), Mary e seus parentes, eles são os únicos personagens não brancos da obra.

Há uma certa tensão entre Mary e os alunos da escola, apesar da cordialidade geral. A relação entre Mary, Paul e Angus somente se aprofunda quando o trio fica sozinho por vários dias, afastados das dinâmicas e das rotinas a que estavam habituados. Quando existiam outros estudantes no ambiente, havia um distanciamento que fazia com que Mary e os demais ocupassem espaços diferentes.

Em uma situação em que um grupo tão pequeno está convivendo diariamente em um espaço quase abandonado, lidando com o tédio e com a solidão, o esperado seria um aumento da convivência entre eles. O que é percebido, na verdade, é uma segregação velada que restringe Mary à cozinha enquanto o professor e os estudantes ocupam quase todos os outros espaços.

Como exemplo nítido disso, em determinado momento, Paul convida Mary para jantar com ele e com os estudantes e um dos jovens fica claramente desconfortável. Kountze (Brady Hepner) não fala nada, mas fica visivelmente contrariado com a possibilidade de Mary se juntar a eles na refeição. Ela percebe e recusa o convite. Os outros estudantes não parecem compartilhar da opinião do colega, mas ficam em silêncio. Quando Mary sai, Kountze fala dela de forma grosseira e ela escuta da cozinha, mas não se manifesta.

Fica subentendido que Kountze é um exemplo menos aceito de um preconceito expresso e violento. Mas o silêncio desconfortável dos demais estudantes demonstra que aquele é um ambiente que proporciona esse clima segregacionista de forma rotineira e normalizada.

Danny também não convive com os alunos apesar de estar morando no terreno da escola. O único que faz as refeições com os adolescentes e que convive com eles ao longo do dia é o professor Paul Hunham.

Além disso, em mais de uma situação é mencionado que o filho de Mary vivenciou uma situação diversa da dos outros estudantes, apesar da idade próxima e de ter estudado naquela mesma escola. Diferente dos colegas, não teve pais ricos nem privilégios que lhe garantissem vaga em faculdades prestigiadas. Ao se formar, entrou no exército e foi para a guerra, na tentativa de juntar dinheiro para tentar a universidade depois de alguns anos. Infelizmente, faleceu em combate.

Sem que isso seja verbalizado, é possível supor que o afastamento inicial de Mary dos diversos espaços da escola e do convívio com os estudantes seja resultado de um segregacionismo que envolve sua raça, seu gênero e sua classe social.

O professor Paul é PcD (pessoa com deficiência). Ele é estrábico e tratado com ironia, desrespeito e chacota, tanto pelos estudantes quanto pelos outros professores. As pessoas o chamam pelas costas de vesgo e de aberração.

Além dele, há um outro personagem PcD no filme. Kenny é um homem que Angus conhece em uma hamburgueria. Eles começam a brigar por causa de um fliperama, mas Angus muda de atitude quando percebe que Kenny não tem uma das mãos. Simulando ingenuidade, ele faz comentários capacitistas e irônicos, o que ofende o outro rapaz. O professor Paul o defende de apanhar de Kenny, mas quando ficam a sós o repreende. 

Ao longo do filme, a postura de Angus em relação ao professor vai mudando. Em determinada cena, ele pergunta de forma interessada e respeitosa para onde deve olhar ao falar com Paul. O professor o ensina. De certa forma, é criada a expectativa de que a postura preconceituosa e capacitista de Angus mude de forma geral e não apenas em relação a alguém de quem ele se aproximou e aprendeu a gostar.

Representatividade de gênero, raça e LGBTQIA+/PcD

Direção e Roteiro*

* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero

A direção do filme é de Alexander Payne, vencedor de duas estatuetas de Melhor Roteiro Adaptado pelos filmes Sideways: Entre umas e outras (2005) e Os descendentes (2012). O roteiro é assinado por David Hemingson e essa é sua primeira indicação ao Oscar.

Ambos são homens brancos e não foi encontrada qualquer menção na internet sobre serem LGBTQIA+ ou PcD.

Dessa forma, a ficha técnica principal (direção e roteiro) é composta 0% por pessoas não-brancas, 0% por mulheres, 0% PcD e 0% LGBTQIA+.

Alexander Payne, diretor do filme Os rejeitados

Elenco principal*

Créditos iniciais/finais

* Classificação é feita de acordo com a declaração pública e disponível das pessoas LGBTQIA+/PcD e heteroidentificação de raça e gênero

Dezesseis nomes são apresentados nos créditos iniciais do filme: Paul Giamatti, Da’vine Joy Randolph, Dominic Sessa, Carrie Preston, Andrew Garman, Tate Donovan, Gillian Vigman, Brady Hepner, Jim Kaplan, Michael Provost, Ian Dolley, Naheen Garcia, Alexander Cook, Melissa McMeekin, Kelly Aucoin e Darby Lee Stack.

Desses, cinco são mulheres (Da’vine Joy Randolph, Carrie Preston, Gillian Vigman, Melissa McMeekin e Darby Lee Stack), o que totaliza 31,25% do elenco. E três são não brancos (Da’vine Joy Randolph, Jim Kaplan e Naheen Garcia), o que totaliza 18,75%.

Não foram encontradas informações na internet sobre qualquer um deles ser PcD ou abertamente LGBTQIA+. Cabe destacar que, apesar do personagem Paul Hunham ser PcD, o ator que o interpreta, Paul Giamatti, não tem estrabismo.
Dessa forma, o elenco é composto por 31,25% de mulheres, 18,75% de não brancos, 0% LGBTQIA+ e 0% de PcD.

Representação

Mulheres

Presença (Bechdel-Wallace)

As mulheres têm nome? 

Se falam por mais de 60 segundos?

Sobre outro assunto que não seja homens? 

Reprovado.

Lydia Crane e Mary conversam na festa de natal e a anfitriã apresenta Mary à sua sobrinha Elise. A conversa não passa de amenidades e dura cerca de 44 segundos no total. Mary e sua irmã Peggy também conversam, mas não é possível escutar o que dizem, então o tempo não foi contabilizado.

Arco Dramático (Mako-Mori) 

Tem mulher? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de gênero?

Aprovado.

Mary Lamb tem arco dramático próprio. Quando o filme inicia, ela acaba de perder o filho Curtis, que morreu na guerra. Sem vontade de celebrar o natal nem de conviver com a família, ela opta por passar as férias reclusa no ambiente do trabalho. Nesse contexto, acaba convivendo com Angus e Paul, que por motivos diferentes também estão passando o final de ano no colégio. 

Com o passar do tempo, o trio vai se aproximando e Mary se abre um pouco com os novos amigos, se mostrando vulnerável em sua dor, aceitando sair da escola para passear com eles e mediando a relação dos outros dois, sempre conflituosa. Por um breve período, eles se tornam uma espécie de família e isso ajuda Mary a processar seu luto. Ao final, ela se permite visitar a família, conversar e rir com a irmã, fazer planos para o futuro e focar na chegada do sobrinho que está para nascer e que representa um recomeço.

Competência (Tauriel)

Houve mulher(es) com atividade profissional definida? 

Ela é competente na atividade?

Grau da Competência Caso a mulher seja competente, quão competentes elas são em sua atividade profissional (1 a 5 , sendo  1 – pouco competente e 5 – muito competente) 

Houve reconhecimento dessa competência?

Aprovado. 

Nota: 4

Mary é a responsável por comandar o refeitório da escola e aparenta conduzir o espaço e os funcionários com eficiência. Apesar da crítica de um aluno agressivo e preconceituoso, os demais sempre elogiam e agradecem Mary pela comida preparada.

Lydia Crane também é funcionária da escola e parece atuar como secretária do diretor. Ela trabalha em uma hamburgueria durante as férias. Sua competência profissional não é expressamente reconhecida no filme em nenhuma das duas áreas.

Além dessas duas, que têm espaço de destaque na obra, existe também uma funcionária do hospital que pede o número do seguro de Angus e uma enfermeira que ajuda o médico a recolocar o ombro do rapaz no lugar. São papéis mínimos, sem tempo de tela relevante que permitam avaliar sua competência.

Qualidade da representação – Mulheres

Como é a representação das personagens mulheres (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 2

Durante as férias, Lydia Crane está nas redondezas da escola trabalhando em uma hamburgueria. Ela convida os demais para passarem o natal em sua casa, evitando que a data festiva passe em branco. Ela também conversa com Paul e o aconselha a preparar algo especial para Angus para que ele se sinta menos sozinho durante as festividades.

Mary é a chefe do refeitório da escola. Apesar de desejar se manter reclusa e sozinha durante as férias, enquanto sofre pela perda do filho, acaba se aproximando de Angus e Paul. Enquanto Lydia dá conselhos gentis, Mary é responsável por dar alguns puxões de orelha em Paul e constantemente lembrá-lo de que Angus é apenas um menino e deve estar se sentindo triste e solitário por ter sido abandonado pela mãe no final do ano.

De certa forma, Mary e Lydia atuam como as “consciências” de Paul, fazendo com que ele controle seu temperamento e impaciência e seja um pouco mais gentil e empático com o adolescente. É como se fosse necessária a presença de mulheres para ensinar o personagem a agir como uma boa pessoa.

Mary, especialmente, é uma personagem bem trabalhada e com história própria. Mas essa relação das duas como mediadoras entre Paul e Angus parece pautada em estereótipos de gênero que associam as mulheres à maternidade, à paciência e à amorosidade, enquanto os homens seriam incapazes de demonstrar carinho ou de se tratar com gentileza.

Raça

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem não branco? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de raça?

Aprovado.

Danny não tem sua história desenvolvida. O estudante Ye-Joon Park tem seus medos e tristezas brevemente explorados, mas não há um desenvolvimento de seu arco dramático.

Ao contrário dos outros dois, Mary tem destaque na trama e arco dramático próprio, conforme já explicado em tópico anterior.

Qualidade da representação – Raça

Como é a representação dos personagens não brancos (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 3

O noivo de Mary faleceu quando ela estava grávida e o filho Curtis morreu na guerra. Ela destaca que ambos morreram jovens, com menos de 25 anos.

O sonho de seu filho era ir para a faculdade, mas ele não pôde realizá-lo por falta de dinheiro. Isso faz com que Mary se dedique a trabalhar e a guardar dinheiro para conseguir pagar a faculdade do sobrinho que está para nascer.

A história de Mary é formada pela morte prematura de homens negros, pela solidão da mulher negra e pela necessidade de trabalhar incansavelmente para mudar a realidade financeira de sua família. Esses são arcos historicamente vinculados a personagens e famílias negras. 

Apesar de retratar uma realidade comum, é desejável ter representações diversas e variadas de personagens não brancos no audiovisual, de forma que o público compreenda que, além dessa, existem outras várias realidades e histórias que merecem ser contadas.

A despeito desse destaque, considerou-se Mary uma personagem secundária muito bem representada, por isso recebeu a nota máxima nesse quesito.

LGBTQIA+

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem LGBTQIA+? 

Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de LGBTQIA+?

Reprovado.

Qualidade da representação – LGBTQIA+

Como é a representação das personagens LGBTQIA+ (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 0

Não há representação LGBTQIA+ no filme.

Cabe destacar que os alunos implicam uns com os outros se chamando de maricas. E mencionam um professor chamado Decker, que dizem ser pervertido e assediar os alunos. 

Dessa forma, não há nenhum personagem LGBTQIA+ no filme, mas em alguns poucos momentos há a indicação de que os estudantes associam ser LGBTQIA+ com aspectos negativos. 

PcD 

Arco dramático (Mako Mori)

Tem personagem PcD? Tem arco dramático próprio? 

O arco dramático é apoiado essencialmente em estereótipos de PcD?

Aprovado. 

O protagonista Paul Hunham é um homem rabugento que detesta os alunos e é igualmente detestado por eles. Ao longo do feriado de final de ano, ele aprende aos poucos a olhar para o jovem Angus com paciência e empatia, levando em consideração seus sentimentos e frustrações. Em contrapartida, aprende também a se abrir com o menino, a compartilhar suas histórias e a emitir opiniões desarmadas.

Devido a acontecimentos do passado, Paul havia se fechado a outros caminhos profissionais que pudessem lhe dar mais alegria e manteve-se estagnado e amargurado. A convivência com Angus faz com que ele recupere desejos adormecidos e tenha vontade de explorar outras possibilidades.

Paul e Angus - Os Rejeitados

Qualidade da representação – PcD

Como é a representação das personagens PcD (escala de -1 a 3)

Sendo -1, estereótipos ofensivos;  

0, não tem; 

1, personagem de apoio ou secundários/principais com muitos estereótipos; 

2, personagens secundários/principais com poucos estereótipos; 

3, personagem principal/secundário muito bem representada, ou personagem principal sem ou com pouquíssimos  estereótipos

Nota: 3

Paul é o protagonista e muito bem trabalhado na trama.

Resumo do Teste Arte Aberta

Os rejeitados

Representatividade

Os rejeitados - direção e roteiro
Osrejeitados - elenco principal

Representação

Os rejeitados - mulheres
Os rejeitados - arco dramático
Qualidade da representação

Estrelas Arte Aberta: 3

Os rejeitados: 3 estrelas

Por Luciana Rodrigues

É formada em Audiovisual e em Letras Português. Uma brasiliense meio cearense, taurina dos pés à cabeça, apaixonada pela UnB, por Jorge Amado e pelo universo infantil. Aprecia o cult e o clichê, gosta de Nelson Pereira dos Santos e também gosta de novela. E, apesar de muitos dizerem o contrário, acha que essa é uma ótima combinação.

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